Alterações ao Alojamento Local: novas soluções e/ou novos problemas?

Uma das críticas mais duras provinha dos condomínios que viam a sua voz embargada em tudo quanto dizia respeito à instalação de estabelecimentos de Alojamento Local em edifícios constituídos em propriedade horizontal. Isso já não acontece com a atual redação do Decreto-Lei n.º 128/2014, de 29 de agosto. Apesar de não ter sido atribuída aos condomínios a liberdade de decidirem sobre a possibilidade da instalação de estabelecimento de Alojamento Local nas frações que compõem a propriedade horizontal (com a exceção da modalidade Hostel que passa a carecer de autorização expressa do condomínio), a lei passa a prever que, no caso de se verificar a prática reiterada e comprovada de atos que perturbem a normal utilização do prédio, bem como de atos que causem incómodo e afetem o descanso dos condóminos, o condomínio se possa opor à sua existência. Será, contudo, preciso que a decisão seja votada por “mais de metade da permilagem do edifício”, sendo que a última palavra fica sempre a cargo do presidente da câmara municipal, que tem de analisar e decidir sobre o mérito da reclamação. O condomínio pode ainda, de acordo com as alterações que se avizinham, aprovar o “pagamento de uma contribuição adicional correspondente às despesas decorrentes da utilização acrescida das partes comuns, com um limite de 30% do valor anual da quota respetiva”, devendo existir um regulamento interno que preveja este agravamento, especificando os critérios. Outra das fortes críticas que este regime tem merecido alicerça-se na ideia de que os estabelecimentos de Alojamento Local, não obstante i) os benefícios económicos para os proprietários dos imóveis; ii) a reabilitação urbana que esta atividade tem impulsionado; e iii) o crescimento turístico que lhe está associado, têm contribuído para a descaracterização das cidades, obrigando os residentes do centro das cidades a deslocarem-se para o seu exterior por não conseguirem competir com os preços do alojamento. As alterações em apreço procuram, também, solucionar, ou mitigar, este problema, para o que se prevê a possibilidade de os municípios estabelecerem limites à instalação de novos estabelecimentos em áreas onde se perfila maior sobrecarga de estabelecimentos de alojamento local face ao número de unidades para habitação. Para garantir a eficácia desse regulamento os municípios podem suspender, pelo prazo máximo de um ano, a autorização de novos registos em áreas delimitadas e até à aprovação do referido regulamento. Em Lisboa, por exemplo, foi já noticiada a suspensão de novos registos de Alojamento Local para cinco bairros históricos. Nas denominadas “Áreas de contenção”, para além dos limites que vierem a ser impostos, cada proprietário não pode ter mais de sete estabelecimentos de AL, sendo que nestas áreas as Licenças de Alojamento Local são pessoais e intransmissíveis. Quem detenha ou explore um estabelecimento de Alojamento Local em edifícios constituídos em propriedade horizontal tem de celebrar e manter válido um seguro multirriscos obrigatório (de responsabilidade civil) para fazer face a eventuais danos decorrente da atividade de prestação de serviços de alojamento, sendo que a falta de existência do seguro “é fundamento de cancelamento do registo”. Outra das novidades reside no facto de o titular da exploração de estabelecimento de Alojamento Local ser solidariamente responsável pelos danos provocados pelos hóspedes nas zonas comuns. Surge uma nova modalidade de estabelecimento de Alojamento Local – Quartos – quando feita na residência do locador (que corresponde ao seu domicílio fiscal), sendo a unidade de alojamento o quarto e até ao máximo de três unidades. A afixação de uma placa identificativa do estabelecimento de Alojamento Local, junto da entrada do estabelecimento, passa a ser obrigatória também nas modalidades de Apartamento e Quarto. As alterações introduzidas, na parte respeitante às condições de acesso à atividade e requisitos de instalação, apenas são aplicáveis para os estabelecimentos de alojamento local que se instalem após a entrada em vigor da presente lei, pelo que, neste capítulo, os registos existentes não serão afetados. É, ainda, concedido um prazo de dois anos aos estabelecimentos de alojamento local já existentes para se conformarem com os restantes requisitos do diploma, nomeadamente requisitos de segurança, seguro multirriscos, placa identificativa e contribuições para o condomínio. Um dos pontos críticos da aplicação das novas regras do regime jurídico do Alojamento Local residirá na definição das zonas de contenção por parte dos municípios e dos limites ao número de alojamentos locais nessa zona e à operacionalidade da gestão desse numerus clausus em face da procura, o que, cremos, não estará isento de contestação jurídica. Outro elemento que poderá implicar discussão decorre da incerteza quanto à decisão do Presidente da Câmara em face da oposição do condomínio ao exercício da atividade de alojamento local, fundada na prática reiterada e comprovada de atos que perturbem a normal utilização do prédio, bem como de atos que causem incómodo e afetem o descanso dos condóminos. Não existe um nexo causal entre a deliberação do condomínio e o cancelamento do registo pelo que as Câmaras Municipais deverão criar um procedimento tendente à verificação dos factos alegados pelo condomínio e dando a possibilidade aos titulares dos estabelecimentos de Alojamento Local de exercerem o direito ao contraditório. Só o tempo nos dirá quais as reais consequências destas medidas. Em todo o caso, não se deixará de dizer que a nova face deste regime trará, seguramente, muita incerteza (jurídica e de investimento), decorrente, nomeadamente, da volatilidade da definição e redefinição das áreas de contenção que comportarão sempre uma alteração superveniente e imprevisível das circunstâncias existentes. Poder-se-á estar, aqui, a pôr a em causa um dos principais motores (senão o principal) da reabilitação urbana das principais cidades, não só em termos arquitetónicos, como também ao nível socioeconómico e cultural.

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