Perante uma audiência de investidores e agentes imobiliários internacionais, durante o MIPIM, o maior encontro global de investidores e promotores imobiliários, entidades públicas e privadas partilharam o palco para discutir soluções de acessibilidade económica para o mercado português.
Os municípios de Lisboa, Porto e Almada foram os responsáveis pela apresentação dos projetos de investimento em curso na sessão “Portugal Conference & Cocktail”, organizada pela Iberian Property e pela APPII, que decorreu esta quarta-feira, dia 13 de março.
Filipa Roseta, Vice-Presidente da Câmara Municipal de Lisboa para a Habitação, apresentou o Programa de Arrendamento Acessível de Lisboa, destacando três pilares: público, privado e parceria. Com mais de 23.500 fogos municipais, a aposta em novas soluções passa agora pela colaboração entre entidades públicas e privadas.
Para além de deter o maior parque habitacional municipal, Lisboa dispõe de terrenos públicos com potencial para incorporar 9.000 fogos (dos quais 2.000 poderão ser disponibilizados ao mercado através da reabilitação). Analisando detalhadamente os números, a autarquia tem como objetivo disponibilizar 4.000 fogos a preços acessíveis por meio de parcerias habitacionais.
Para isso, propõe-se aplicar um modelo de arrendamento com a duração de 90 anos, com planeamento urbanístico previamente aprovado no terreno. A transmissão do arrendamento é permitida sem interferência do parceiro público, e as rendas devem ser 20% inferiores ao preço de mercado. O critério de seleção do investidor, a quem será adjudicado o terreno, baseia-se na proposta de renda mais competitiva.
Dando mais um passo na resolução dos problemas de acessibilidade económica, Filipa Roseta explicou ainda que a autarquia está disponível para suportar a diferença entre os rendimentos de 30% da família e o valor final da renda. Nestas operações de parceria habitacional, Lisboa tem já 647 unidades prontas a lançar, divididas em dois projetos nas zonas do Parque das Nações e Benfica Sul.
Seguindo a mesma abordagem, Pedro Baganha, vereador do Pelouro do Urbanismo e Espaço Público e Pelouro da Habitação, apresentou o Programa de Arrendamento Acessível do Porto. Começou por recordar que 11% de todas as habitações do Porto pertencem ao município, o que se traduz em ter 13% dos habitantes como seus inquilinos. Para Pedro Baganha, a crise da acessibilidade económica merece atenção, especialmente no que respeita à classe média.
“O stock acessível representa apenas 2% da habitação pública, o que claramente não é suficiente, mas já estão a ser dados passos importantes”.
Atualmente, o Porto conta com mais de 13.000 fogos de habitação municipal, e espera-se que a nova política de rendas acessíveis aumente significativamente esse número. No que diz respeito ao investimento público, os projetos em curso totalizam 992 novos fogos, sendo que o maior projeto entrará em concurso público no próximo mês. Este projeto, localizado em Lordelo do Ouro, prevê a construção de 300 novos fogos, representando um investimento de 65,6 milhões de euros.
Relativamente ao investimento privado, o município tem um plano pró-desenvolvimento, visando aumentar a densificação e criar novas zonas de atividade económica. O plano diretor da cidade contempla áreas com incentivos fiscais para habitação a preços acessíveis. «Em 2023, o Porto foi líder nacional no licenciamento de novas habitações, com 2.035 novos fogos licenciados, algo de que nos orgulhamos muito», afirmou.
Finalmente, abordando os modelos de parcerias público-privadas (PPP), o programa "Porto com Sentido" surge como a solução municipal para atrair investidores a aderir à oferta acessível. Com isenções fiscais e a possibilidade de liquidez imediata, as rendas são estabelecidas próximo do valor de mercado, e o Porto garante 100% de ocupação, uma vez que o inquilino é o próprio município.
O Porto estabelece um contrato de arrendamento de 10 anos, subarrendando-o a famílias, garantindo assim aos investidores que não há qualquer risco de arrendamento. Até à data, foram entregues 270 unidades ao abrigo deste programa, e Pedro Baganha revelou que estão em curso negociações para fechar o primeiro empreendimento BTR com este programa também. Destaca-se que existe uma concessão de 90 anos com contratos de aluguer de 30 anos com o Município.
"O país deve unir-se para cumprir a nova dinâmica do mercado".
Inês Medeiros, Presidente da Câmara Municipal de Almada, realçou que as novas gerações já não encaram o arrendamento de uma casa como uma decisão para toda a vida. Nesse sentido, as autarquias devem ser proativas na compreensão de que a habitação serve o cidadão e precisa de ser suficientemente flexível para se ajustar às decisões de arrendamento de acordo com as diferentes fases de vida das pessoas, o que estabelece uma dinâmica desafiante no mercado.
Com 2.314 fogos municipais, a política de Almada para a habitação acessível está a focar a sua atenção nos subsídios de renda, tendo em conta que tanto os preços de venda como os de arrendamento por metro quadrado na cidade aumentaram mais de 12% durante o último ano.
Inês Medeiros defendeu que, ao debater esta questão em França, Portugal deveria examinar mais de perto o modelo do país anfitrião, onde o setor privado está a gerir a habitação social, algo que, segundo ela, «vale a pena refletir».
Setor privado e os programas de habitação a preços acessíveis
Numa mesa-redonda moderada por António Gil Machado, Sócio do Grupo Iberinmo, representantes privados da Krest, Fidelidade e Vizta comentaram a atratividade destas iniciativas públicas.
Para Fernando Vasco Costa, CEO da VIZTA, embora o quadro legal ainda necessite de alguns ajustes, estão a ser feitos esforços em conjunto com a APPII para torná-lo mais favorável ao investimento. No entanto, um dos principais desafios enfrentados por estas propostas públicas é a competição no mercado de venda. «Quando há tão poucos projetos licenciados nas cidades, é mais fácil colocá-los apenas no mercado de venda, o que provavelmente terá uma boa procura por parte dos investidores».
Claude Kandiyoti, CEO da KREST, um promotor presente no mercado português nos últimos 10 anos, partilhou a sua opinião sobre outros mercados de arrendamento europeus com um longo historial. No caso de Bruxelas, por exemplo, o governo regional tinha ONG a gerir projetos de habitação social.
Para Claude Kandiyoti, a chave para que estas parcerias funcionem é ter um conceito transparente, o que implica que os papéis devem ser definidos com uma clara separação entre o promotor e o inquilino. Além disso, «acessibilidade não significa desvalorizar a componente do modelo de negócio; na verdade, é extremamente importante ter uma estratégia clara de entrada e saída».
O CEO informou que atualmente Portugal tem o menor stock de habitação a preços acessíveis da Europa, e tem a certeza de que, em algum momento, se os municípios quiserem cumprir as suas metas, terão que comprar projetos já construídos.
Portugal recebeu recentemente boas notícias com a aprovação do “Simplex” – um novo quadro de licenciamento. Segundo Miguel Santana, administrador da Fidelidade Property, este regime promete trazer uma importante poupança de tempo, o que pode se traduzir num aumento da rentabilidade. O responsável explicou que agora a responsabilidade crítica nesta matéria recai sobre a equipa de aprovisionamento.
No geral, o sentimento em relação ao futuro é bastante positivo e os investidores privados estão a explorar maneiras de colaborar com as autarquias. Na opinião de Claude Kandiyoti, a concessão ou arrendamento por 90 anos destes novos programas de acessibilidade económica atrairá novos capitais institucionais para o mercado, uma vez que o financiamento também será mais acessível.
A conferência terminou com um cocktail de cortesia, patrocinado pela Krest, Fidelidade e Vizta, proporcionando uma oportunidade única para expandir as conexões na feira internacional e conhecer melhor os principais intervenientes do setor imobiliário português.