A seu ver, o contexto em que vivemos veio sobretudo acelerar tendências já existentes, e que hoje mais do que nunca «é preciso reabilitar, reciclar, repensar os modelos de vida com consequências diretas na forma de habitar, de construir, de utilizar os espaços públicos», num processo em que a arquitetura pode e deve ter um papel de monta.
1.Estamos a viver in loco a primeira pandemia verdadeiramente global. Tratando-se de um acontecimento tão inédito e disruptor, quais serão os reflexos na prática da arquitetura contemporânea? Haverá uma arquitetura pré e pós-Covid?
Muitas das questões que a Covid vem colocar em relação à arquitetura, eram temas que já começavam a surgir e a transformar o mundo da arquitetura, embora isso não fosse ainda muito visível, particularmente no nosso país. As pessoas têm a ideia de que a arquitetura e o mundo construído é algo que se faz para a vida, e nunca foi assim na história. Por exemplo, em Portugal, nós não só não temos uma cultura de manutenção dos edifícios, como muito menos temos uma cultura de reabilitação e de adaptação. Um país como Portugal, que aderiu ao Tratado de Paris, ainda não se consciencializou do que isto quer dizer em termos de modelo de transformações e de adaptações de modelos de vida, sobretudo, em relações que se prendem com a construção, quer dos edifícios, quer do próprio espaço público. Quando aparece uma pandemia, o que é que acontece? É verdade que esta é a primeira pandemia verdadeiramente planetária, embora a Gripe Espanhola tenha já afetado outros continentes, e isto revela que há um mundo paralelo que os cientistas, médicos, virólogos, especialistas de mobilidade, arquitetos, urbanistas, entre outros, sabem que existe, mas que ignoram sistematicamente. Normalmente, os efeitos destas epidemias, e é o caso da Gripe Espanhola, são efeitos que, uma vez passada a crise, têm uma forte tendência a cair no esquecimento. Quando existe uma pandemia, o que está em causa é uma enorme vulnerabilidade do mundo construído, das cidades e da paisagem. Mas esta vulnerabilidade é algo que é posto à prova por outras razões. A guerra, por exemplo, é totalmente destruidora de cidades inteiras. Veja-se o que a Europa viveu no século passado com duas guerras mundiais. E o que é curioso na surpresa destes acontecimentos, é que expõem as vulnerabilidades. Mas existem outras como, por exemplo, as catástrofes naturais. Há cerca de 15 anos, na zona da Indonésia, houve um tsunami com consequências completamente devastadoras e esse é um fenómeno que sabemos que se pode repetir, sem qualquer aviso prévio. E isso levou a desenvolver um mecanismo de deteção de um tsunami, que permite com um prazo relativamente curto de meia hora, avisar todas as pessoas que estão nas praias para que possam sair rapidamente e defenderem-se dos efeitos deste fenómeno. Uma das coisas que é importante numa pandemia deste tipo é criar mecanismos em que se possa, um pouco à semelhança do tsunami, dar um alerta rápido que permita tomar medidas, evitando que este se propague. Tem de haver preparação para que seja possível tomar estas medidas e com isso evitar ou reduzir algumas consequências tão drásticas como o confinamento. Esta crise teve ainda outro efeito importantíssimo. Esta crise veio revelar uma contra-crise que eu chamo de CO2-20. A paragem da produção e da indústria e o confinamento vieram limpar a poluição. A descarbonização, as economias circulares, repensar a construção e o espaço público de forma abrangente, estudar novas formas de reabilitar e construir, eram medidas que estavam já em curso, mas ainda com resistência. Agora o país tem que acordar. E assistimos já a reações positivas. O Ministro do Ambiente, em entrevista, fala numa série de medidas relacionadas com a habitação e o espaço público que, na verdade, já haviam sido equacionadas, mas que agora se desenvolvem.
Na minha opinião, não irá existir propriamente uma arquitetura pós Covid, mas vai haver certamente uma arquitetura que tem de se transformar, reagir. É preciso reabilitar, reciclar, repensar os modelos de vida com consequências diretas na forma de habitar, de construir, de utilizar os espaços públicos. Tudo isto já existia antes da Covid, ela apenas vem mostrar essa evidência de uma forma muito clara e transversal.
2. A crise sanitária veio também colocar em evidência alguns aspetos-chave que muitas das vezes nos passam despercebidos, a começar desde logo pela necessidade de termos edifícios mais "saudáveis", mais capacitados para responder a um cenário como o que vivemos... Posto isto, qual o papel que os arquitetos devem desempenhar neste campo? E, sobretudo o que é que pode ser mudado a partir daqui, desde logo pela forma como se concebem os edifícios?
Os arquitetos têm um papel decisivo e incontornável neste repensar sobre como seguir no futuro e perceber e a que é que os edifícios devem responder. A sua forma é claramente um desafio, mas é um desafio que já existe também há muito tempo e, inclusivamente, a própria normativa. Se nós virmos, do ponto de vista da higiene sanitária e das próprias pandemias, a história das cidades e da arquitetura tem tido sempre uma evolução de resposta. O plano Pombalino de Lisboa, por exemplo, é uma resposta altamente higienista aos grandes problemas que havia na cidade medieval, sobretudo na zona da baixa, que era um local extremamente insalubre, onde não havia esgotos, as ruas eram labirínticas, não entrava sol, e que são destruídas pelo terramoto. E com isso nasce a nova cidade das ruas em quadrícula, dos espaços abertos, do saneamento, dos esgotos, do abastecimento de água, e isso é um grande salto em frente em resposta à questão das epidemias. Há uma inter-relação muito forte entre a arquitetura, a própria forma da cidade e a chamada medicina pública, que está atenta a esta reação, sobretudo às epidemias, às pandemias, às pestes. Obviamente que os arquitetos já vinham, estão e provavelmente terão de reforçar a atenção na resposta a estas questões. Mas há um outro aspeto que me parece interessante e é que, em grande parte, o facto deste problema ser levantado porque as pessoas foram obrigadas a ficar confinadas e, por isso, a viver e sentir a casa onde se habita muito mais intensamente. Quando se é obrigada a ficar fechado durante meses, a relação de perceção do espaço onde se está é muito mais dramática e intensa do que no dia a dia habitual. E é muito curioso porque isso desperta na cidadania essa sensibilidade que eu espero que seja também traduzida numa reivindicação, da sua parte, para que a resolução desses problemas seja acelerada, e onde a arquitetura e os arquitetos têm um papel incontornável.
3. E ao nível do espaço público? Conceptualmente, que alterações podemos vir a observar daqui em diante?
A sociedade portuguesa a seguir à Expo 98 descobriu a importância do espaço público, tema que tinha desaparecido um pouco do ambiente e até da própria cidadania. As cidades eram habitadas com um certo tipo de relação com o espaço público, que tem aspetos positivos, mas que em alguns casos tem também a sua degradação. Existe especulação que constrói nas periferias, cidades em que os espaços públicos não são privilegiados porque não são rentáveis e que vão, muitas vezes desaparecendo, com algumas raras exceções. A partir sobretudo da intervenção da Expo 98, começa-se a perceber uma reabilitação importantíssima do espaço público, sobretudo nos últimos 15 anos da gestão da Câmara Municipal de Lisboa. É muito visível, mesmo na cidade histórica, e este processo vai muito de encontro às vivências e limitações que este Covid pôs em claro. Por exemplo, quem vive em bairros muito densos, de ruas estreitas e com pouco sol, apesar de estar em casa, se quiser sair à rua está muito exposto e dificilmente consegue respeitar a distância social. O espaço público é diminuto e confinado e não tem um sítio onde possa ter uma praça arborizada, com dimensão suficiente para haver variedade, não só de espécies, como também de fauna e flora. Uma das coisas que a cidade que reage ao câmbio climático vai ter de ter é uma proximidade muito grande da própria produção agrícola, e o primeiro exemplo ténue disso são as chamadas hortas comunitárias que começam já a aparecer. Portanto, eu diria que a metropolização das cidades veio desequilibrar esta questão, e isso afeta claramente o espaço público.
4. Assumindo que o mundo não será o mesmo depois da pandemia, faz sentido para a arquitetura repensar a forma como usamos os imóveis? Se sim, quais e porquê?
Estes são modelos que já estão a ser desenvolvidos noutros países. Posso citar um concurso de uma pequena área de expansão urbana na cidade de Berna, há cerca de ano e meio, em que as regras para esse concurso previam, por exemplo, a coexistência com hortas comunitárias, inserir no meio do tecido construído corredores de espaço público verde e de continuidade e que, nos modelos de habitação, por exemplo, punham muito em evidência questões como a coabitação, mas sobretudo o trabalho partilhado e a mistura e proximidade de usos. Os modelos que se desenvolvem da cidade moderna, e eu diria sobretudo a partir dos anos 40, são modelos de divisão da cidade. Há uma zona para habitar, uma zona para o tempo livre e uma zona para trabalhar, onde se concentra toda a indústria. Este modelo está claramente posto em causa já há vários anos, e temos de voltar novamente à cidade unida, e não à cidade dividida. Portanto, trabalhar e habitar são coisas que têm de se aproximar. E a Covid veio revelar que o teletrabalho já estava instalado, mas não tão utilizado quanto ele já permite ser. Estes modelos estão já a ser desenvolvidos em muitos sítios, e também em Portugal, embora em pequeno número. A Covid veio mostrar que é importante estar atento às direções da transformação, que neste caso querem dizer unir, e não dividir, voltar a ligar funções e usos. O confinamento obrigatório veio agudizar muito a perceção do cidadão e do habitante das condições em que estava a viver e a trabalhar.
5. Depois desta quase paragem da atividade económica no 2º trimestre, por via da estratégia de isolamento, e com toda a incerteza quanto à evolução da situação no 2º semestre; como antevê o impacto na fileira da arquitetura? Neste contexto, que desafios pode esta fileira antecipar para os próximos meses?
É importante perceber que esta é uma crise com contornos muito diferentes. A crise da Covid 19 não é a crise do subprime e das consequências subjacentes que puseram o país em crise desde 2008 até 2018, sobretudo no mundo da construção e arquitetura, começando a haver, nos últimos dois anos, sinais de retoma. Esta crise tem um impacto que obriga a um esforço gigante para atender às questões sanitárias, mas tem também um impacto económico, que é imediato e gravíssimo, que é a paragem da produção. E isso está a criar um mundo de fragilidade que vai obrigar a um retomar que, provavelmente, irá demorar algum tempo. O impacto económico e sobretudo financeiro é enorme e vai ter de ser gerido a nível planetário, continental e nacional. E as medidas têm de ser tomadas. A nível nacional, por exemplo, este vírus conseguiu, temporariamente, criar uma convergência governamental interpartidária. Não me parece que fosse sequer possível definir uma estratégia de reação tão limitadora das próprias liberdades, mas vital para superar este impacto, sem que isso tivesse acontecido. E isso é um sinal que se está a refletir, e em que começa já a aparecer sinais de retoma. Há uma série de medidas financeiras que envolvem números de investimentos bastante altos e que mostram que o setor da promoção imobiliária da construção privada está a reagir de uma forma bastante positiva e proativa. Outro aspeto curioso, é que a indústria da construção não parou, e embora tenha sido afetada, porque tem de funcionar com medidas que afetam o seu rendimento, continua ativa e com perspetivas eventuais de retoma. Agora, é incontornável que a crise económica e financeira é fortemente impactante. Ainda assim, eu tenho esperança e otimismo em dizer que espero que a perspetiva da retoma seja gradual, e não tão longa como a anterior. Acredito que no final de 2021 as coisas já se possam estar a reativar.
6. Lembrando a velha máxima de que todas as crises são também campo de oportunidades, quais as principais oportunidades que poderão surgir para a arquitetura neste momento inédito na nossa história?
Atualmente o mundo da arquitetura é muito mais disperso. Há uma parte significativa de arquitetos que estão na função pública a exercer um papel importantíssimo e que tem os seus desafios a responder, nomeadamente na saída desta crise, e onde há muitas coisas que já estão a ser feitas. Uma delas, por exemplo, é a questão da uniformização e agilização dos processos de apreciação de licenciamento e pós-licenciamento, que é um tema claramente de âmbito autárquico, mas também transversal de todas as autarquias. Há uma coisa do mundo do projeto da arquitetura que eu acho que se aplica de uma maneira muito interessante a esta pergunta. Quando se refere que todas as crises são também campos de oportunidades, os arquitetos sabem que quando estão a trabalhar num projeto, e um projeto é um caminho de escolhas que o vão definindo, surgem situações difíceis de resolver. Uma das virtudes do exercício do arquiteto quando está a trabalhar no projeto, é a de transformar essas dificuldades em oportunidades. Eu creio que, de facto, o grande desafio de um momento como este, é transformar a crise em oportunidade. E esse é o grande desafio que se põe à sociedade civil na qual todos nós estamos envolvidos e, por isso digo, que isto só lá vai com todos. O projeto da arquitetura, especialmente no contexto das cidades portuguesas, é cada vez menos o projeto de fazer prédios novos, o projeto das periferias continuarem a crescer. Nós sabemos que o crescimento demográfico em Portugal é a pirâmide invertida e, por outro lado, a construção do projeto do edifício novo vai continuar a existir, mas eu diria que, provavelmente, com menor ritmo, mas, por outro lado, cresce muito o projeto de reabilitação do edifício. Atualmente, demolir é um problema na economia circular. Já reabilitar é um tema cada vez mais intenso no trabalho da arquitetura. Outra questão, que é uma palavra que os arquitetos ainda não internaram porque acham que desqualifica o exercício da arquitetura, mas que, por exemplo, em Inglaterra já houve até quem sugerisse adaptar o tema da arquitetura, é a dos arquitetos como adaptadores. Ou seja, há muita coisa construída que tem de ser adaptada, transformações que podem começar logo no interior das casas. Eu acho que a experiência intensiva e dramática da habitação das pessoas que estiveram em confinamento vai despertar o mundo de exigências de transformação para o qual a arquitetura já está a trabalhar e está particularmente preparada para o fazer. Os espaços comuns da casa têm de ganhar outra importância, a orientação da exposição solar e a própria forma do edifício tem de ser reequacionada nesta nova perspetiva. E o mesmo acontece no espaço público. A arquitetura está envolvida em todas as consequências sobre o território e a paisagem, e não é só a arquitetura dos arquitetos, também a arquitetura dos paisagistas e os génios das engenharias que estão envolvidos em projetos de infraestruturas, e que terão de intensificar o diálogo interdisciplinar para responder aos desafios do futuro.
7. Embora o trabalho do arquiteto não tenha obrigatoriamente que ser desenvolvido a 100% dentro das paredes do ateliê, havendo até bastante flexibilidade... Como é que a arquitetura se está a adaptar ao novo contexto trazido pelo confinamento obrigatório destas últimas semanas?
O meu ateliê está em confinamento desde ainda antes do estado de emergência e é curioso como uma grande parte dos ateliers de arquitetura que eu conheço também o decidiram fazer. Este processo foi feito, diria eu, com um impacto quase residual em relação àquilo que podia ser expectável. Ao longo das semanas, o processo de trabalho foi-se reajustando e hoje as pessoas que estão em casa a trabalhar, ainda que com algumas assimetrias, estão a produzir. Provavelmente um rendimento mais baixo, mas, por outro lado, estamos a descobrir que grande parte da tecnologia que era usada, tal como as videoconferências que permitem comunicar à distância, estavam claramente a ser subutilizadas. Uma significativa parte do trabalho no meu atelier é no estrangeiro e temos projetos em curso na Suíça e em Itália, o que obrigava a muitas deslocações a estes locais. Pensando agora, chego à conclusão de que muitas destas viagens não teriam sido necessárias, e creio que vão deixar de o ser. De facto, acredito que os sistemas de videoconferência podem ser implementados até para a assistência do arquiteto à obra. Não digo sempre, mas parcialmente.
8. E por falar em obras, como estão a decorrer os trabalhos dos projetos que têm neste momento em andamento? Notam algumas quebras ou atrasos?
Nós, infelizmente, temos poucos projetos em obra. Temos alguns na periferia de Lisboa. Temos em andamento a obra de uma casa, relativamente pequena, e obras em curso na Itália, em Vicenza, na Ligúria, numa cidade medieval chamada Albenga. Esses trabalhos são realizados com gabinetes locais que estão a fazer o seguimento do trabalho e, embora me desloque quando é necessário, muitas das coisas são geridas, e agora com a Covid ainda mais, à distância. Eu acredito que isto vá ter alguma influência no atraso das obras porque há um problema de adaptação de métodos de trabalho e creio que isso se vai notar. Outra questão que eu espero que seja minorada é a paragem. O grande drama na crise de 2008 e 2009 foi mesmo a paragem e o abandono. O nosso ateliê, nessa altura, estava com uma série de projetos e, por isso, tinha crescido até numericamente para perto de 40 colaboradores, e teve de fazer uma redução drástica de 12 a 15 colaboradores porque, de facto, desapareceu o trabalho. As obras que estavam para iniciar pararam e muitas delas ainda continuam paradas. Nós estamos agora com a perspetiva de retomar três trabalhos, desses que estão parados desde essa crise. Essa deverá ser também uma das consequências desta crise, uma vez que o impacto económico é muito grande. Ainda assim, existe uma grande proatividade de todo o setor da construção e da promoção do imobiliário público e privado, e dos projetistas de tentar transformar a crise numa oportunidade, ainda que condicionada.
9. Que mudanças veio trazer o Covid-19 em relação aos objetivos propostos no início do ano? E, em termos de carteira de projetos, quais as principais novidades em que têm andado a trabalhar?
A atividade no gabinete está a decorrer em teletrabalho, com alguma quebra que me parece normal, pela adaptação que é necessária fazer e por alguma limitação. O teletrabalho e o confinamento, como os próprios projetos, são oportunidades, e temos de as saber aproveitar. Em relação aos objetivos previstos no início do ano, obviamente que esta situação já está a ter impacto no plano que previa a ativação e a reativação de vários trabalhos e que, devido à Covid, estão em grande parte em suspensão ou a ser geridos em menor velocidade. Por exemplo, no caso do projeto da Cidade da Música, em Genebra, há claramente um efeito de abrandamento de ritmo de trabalho motivado por isto, e que se vai traduzir no próprio plano económico e financeiro do ateliê. Isso é previsível e, dessa forma, estamos a tentar gerir e encontrar outras saídas. Um efeito secundário é que o confinamento em casa vem também reduzir as despesas de uma maneira bastante razoável. Uma que é óbvia, no nosso caso, é o facto de não haver viagens aéreas. Também a atividade no escritório estar parada, a redução do consumo elétrico, telefónico, entre outros, do ponto de vista financeiro, estão a induzir um pequeno parâmetro que permite corrigir um pouco o abrandamento também do rendimento. Neste momento, temos uma carteira de projetos ativa que está a ser gerida. Tínhamos também uma série de contactos de potenciais encomendas que não desapareceram totalmente, embora nalguns casos sinta alguma insegurança de quem está a gerir as encomendas, levando a que se retraiam. Um dos potenciais clientes, muito ligado à indústria do turismo, referiu a hipótese, com alguma admiração minha, de que esta é uma boa altura para os hotéis, aproveitando o facto de estarem fechados, fazerem reabilitações e até expansões eventualmente. E, atendendo a que esta crise poderá demorar entre um ano e meio a dois anos, esse será o tempo do projeto mais o licenciamento e eventualmente até ao concurso de empreitada, para que possa estar tudo pronto para quando começarem a sair da crise. Esta é uma atitude muito proativa, mas que pressupõe também um promotor que tenha capacidade de gestão financeira com a banca para poder fazer isto. Nós estamos expectantes, a ter uma atitude proativa e positiva. Continuamos também muito focados em concursos, isso é aliás uma contante do nosso ateliê desde sempre, sobretudo nos anos 90 quando ele tem uma grande expansão. Os mecanismos de concurso no nosso país sofreram um embate muito forte com a crise e as suas sequelas, que se traduzem inclusivamente nos formatos de concurso da Administração Pública e que, por arrastamento, afetaram também o formato dos concursos da Privada, levando-os a desaparecer. Nos últimos dois anos têm vindo a reaparecer na construção pública, na minha opinião da pior maneira, porque têm claramente privilegiado algo que não é um concurso de arquitetura, mas sim uma adjudicação a um custo mais baixo. Não há qualquer critério qualitativo, é fortemente penalizante do desempenho dos serviços da arquitetura e está a ser fortemente responsável pela precariedade do trabalho na arquitetura, sobretudo nos ateliers mais vulneráveis, e isso é um problema. Mas, apesar de tudo isso, nós não perdemos o horizonte do concurso e estamos ativos tanto quanto podemos. Neste momento, a desenvolver um concurso cá, e acabámos de entregar outros no norte de Itália.
Foto: Inês d'Orey