Comércio de rua lidera valorização no retalho

Comércio de rua lidera valorização no retalho
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O comércio de rua em Portugal está a liderar a valorização do setor do retalho, principalmente ao longo dos últimos 10 anos. Mas todos os segmentos deste setor estão em rota de crescimento, segundo a CBRE.

Neste tempo, os principais eixos de comércio de rua em Lisboa e no Porto registaram aumentos expressivos das rendas prime. Em Lisboa, subiram 25% nos últimos 10 anos, nomeadamente na Avenida da Liberdade, e 60% no Chiado. Na rua de Santa Catarina, no Porto, aumentaram 183%, refletindo o forte dinamismo da cidade e o impacto do turismo no comércio de rua.

O estudo “Realizing Potential in Retail”, da CBRE, mostra que houve uma média de 175 novas aberturas de lojas de rua por ano entre 2021 e 2023, com um recorde de 211 aberturas no ano passado. Considerando os dados monitorizados pela CBRE, só no primeiro trimestre de 2025 já se contabilizaram 33 novas lojas, o que demonstra uma continuidade no interesse dos operadores por este formato. O setor de Food & Beverage continua a liderar, tendo representado, no primeiro trimestre de 2025, 73% das aberturas no Porto e 45% em Lisboa - reflexo da crescente procura por experiências de consumo diferenciadoras em zonas de elevada circulação pedonal e turística”.

Carlos Récio, Head of Retail da CBRE Portugal, explica que “estes números refletem não apenas a crescente procura por parte de marcas internacionais de elevada visibilidade, mas também o impacto muito positivo que o turismo representa, especialmente no Chiado e na rua de Santa Catarina. A performance das rendas nestes eixos emblemáticos demonstra a força do retalho em Portugal, que continua a atrair operadores de referência, mesmo num contexto de grande seletividade e pressão sobre a oferta”.

O turismo é o grande catalisador do comércio de rua em Portugal, principalmente a sua retoma pós-pandemia que superou todas as expetativas. Segundo este estudo, a pressão turística nas duas principais cidades portuguesas é elevada: Lisboa regista atualmente mais de três turistas por cada residente, e o Porto apresenta uma evolução semelhante, colocando ambas as cidades como destinos de grande afluência. Este indicador tem um impacto direto no desempenho do comércio de rua, especialmente em zonas históricas e com grande densidade pedonal, como o Chiado, a Baixa Lisboeta ou o centro do Porto.

Mas estas zonas não devem ser encaradas exclusivamente como áreas turísticas. Segundo o estudo, a dinâmica urbana está a mudar, e os consumidores locais procuram cada vez mais pragmatismo e conveniência no seu quotidiano, privilegiando outras áreas da cidade. Carlos Récio exemplifica que “zonas como Santos, em Lisboa, ou a rua da Picaria, no Porto, começam a destacar-se pela sua oferta comercial adaptada aos residentes – menos turística, mais funcional e próxima. Em sentido oposto, verifica-se um movimento em locais como o Mercado da Ribeira ou o Mercado do Bolhão, onde, apesar de uma componente de tráfego local, predomina a presença de turistas internacionais”.

Centros comerciais e retail parks são “pilares estruturais” do mercado

Este relatório enfatiza que, paralelamente à dinâmica do comércio de rua e à expansão dos novos conceitos de proximidade, os centros comerciais e os retail parks continuam a ser os “pilares estruturais” do mercado português, com desempenhos distintos, mas complementares.

A adição de stock dos retail parks atingiu um total de 625.230 metros quadrados em 2024, enquanto os centros comerciais registaram 2,9 milhões de metros quadrados. Os retail parks têm maior expressão no Norte (38%) e os centros comerciais concentram-se principalmente na zona de Lisboa (37%).

Segundo a CBRE, esta tendência reflete “por um lado, a crescente preferência por retail parks em zonas de expansão urbana, impulsionada pela flexibilidade de desenvolvimento e pela ancoragem em operadores de conveniência; por outro lado, a consolidação dos centros comerciais em zonas de maior densidade populacional e capacidade de consumo, onde o desafio passa, cada vez mais, por adaptar os espaços às novas exigências dos consumidores e dos operadores”.

Carlos Récio comenta que “a forma como está distribuída a área bruta locável (GLA) nos centros comerciais – com cinco categorias principais (Moda, Lazer, Retalho Especializado, Supermercados e Restauração ) a representarem já 78% do total – está a tornar-se uma variável crítica para garantir a rentabilidade dos ativos. A pressão para maximizar a receita anual por m² está a levar os proprietários a repensar a alocação do espaço, sobretudo em segmentos com maior potencial de valorização. Um bom exemplo disso é a área de Food & Beverage, onde começam a surgir transformações visíveis: desde a diversificação de oferta até à qualificação dos espaços de consumo, com zonas de seating mais apelativas e ampliação das áreas destinadas à operação. Tudo isto responde à procura por experiências mais completas e diferenciadoras, com impacto direto na atratividade e na performance dos centros comerciais”.

Investimento ultrapassou os 1.000 milhões em 2024

O estudo da CBRE confirma que o setor do retalho em Portugal está a atravessar uma nova fase de dinamismo e atratividade, e o investimento é prova disso. Depois de atingir um pico de investimento histórico em 2018, de 1.435 milhões de euros, o mercado ressentiu-se com a fase da pandemia, mas a tendência inverteu-se nos últimos dois anos. O volume de investimento passou de 302 milhões de euros em 2022 para 577 em 2023 e para 1.113 milhões de euros em 2024, um sinal da recuperação da confiança dos investidores. Só no primeiro trimestre deste ano o setor atraiu 398 milhões de euros, o que, segundo a consultora, antecipa mais um ano de forte desempenho.

Este dinamismo justifica-se com vários fatores estruturais, como o aumento das rendas no comércio de rua, o fluxo turístico crescente de Lisboa e Porto, ou com a reconfiguração dos formatos tradicionais. Os centros comerciais continuam a representar uma fatia importante do investimento, mas os retail parks ganham mais protagonismo, beneficiando da procura por conveniência e acessibilidade.

No entanto, o mercado enfrenta a escassez de espaços prime como uma limitação crítica, nomeadamente em zonas urbanas mais procuradas, que representa um desafio à expansão e à renovação da oferta comercial. A estrutura fragmentada do comércio de rua, com escassez de espaços e elevada seletividade por parte dos operadores, continua a ser um fator limitador. A dinâmica de abertura de lojas, assim, está fortemente condicionada pelas exigências de produto adequado e não por uma aceleração da procura.

A CBRE sublinha que “os operadores estabelecem uma forte concorrência por localizações premium, sendo que a decisão de entrada no mercado está, muitas vezes, dependente da disponibilidade de espaços nas localizações certas – o que obriga a um planeamento cuidadoso e uma abordagem altamente estratégica por parte das marcas”.

Otimismo cauteloso para 2025

Apesar de todos estes indicadores positivos, a CBRE apresenta uma “visão prudente” face às perspetivas para 2025, e explica que “a forte procura pode não se traduzir automaticamente num recorde de novas aberturas, uma vez que a oferta disponível nos eixos mais procurados continua limitada. Ainda assim, a tendência é clara: Portugal continua a afirmar-se como um mercado atrativo para o retalho, com as cidades do Porto e de Lisboa a liderarem a transformação do setor, suportadas por um forte impacto do fenómeno turístico, valorização imobiliária e procura consolidada por experiências comerciais diferenciadoras”. 

Carlos Récio completa que “o retalho em Portugal está a atravessar um momento de reinvenção e de crescimento sustentado, alimentado por tendências estruturais como a evolução dos hábitos de consumo, a atratividade do turismo e a capacidade de adaptação dos diferentes formatos. Seja no comércio de rua, nos centros comerciais ou nos retail parks, o setor está a responder com soluções cada vez mais ajustadas às necessidades dos operadores e dos consumidores. Este é, sem dúvida, um dos segmentos mais resilientes e estratégicos do imobiliário nacional, com potencial para continuar a atrair investimento e inovação nos próximos anos”.