Centros comerciais: Lojas são o novo elemento da operação logística

A pandemia trouxe uma série de transformações ao mercado do retalho, e dos centros comerciais em particular, mas uma coisa parece ser certa: as lojas não vão desaparecer, e são hoje parte essencial da cadeia de distribuição do próprio e-commerce. Desempenham um papel na parte da logística e também da experiência do consumidor. Os centros comerciais foram o tema central do mais recente Pequeno-Almoço Conferência da Vida Imobiliária, organizado em Lisboa a 6 de dezembro, em conjunto com a Cushman & Wakefield. Apesar das nuvens negras da atual conjuntura económica e geopolítica, o setor mostra-se resiliente e preparado para se adaptar às novidades do consumo e da distribuição. Fernando Oliveira, da Mundicenter, testemunha que «o e-commerce aumentou significativamente com a pandemia. Ainda assim, estamos a aumentar as vendas, em níveis de 2019, e as expetativas para 2023 continuam a ser boas, apesar das várias incertezas». Regista «alterações da cadeia logística muito significativas», e diz mesmo que «as lojas nos centros comerciais passaram a fazer parte da rede de distribuição do e-commerce». Na experiência da Mundicenter, «algumas lojas começaram a pedir mais área, porque precisam também para esta vertente logística». A ideia base é levar o consumidor à loja, onde a probabilidade é de voltar a consumir (presencialmente ou mesmo online), mesmo que vá apenas levantar uma encomenda, e que o centro comercial seja «de conveniência». A lógica é de «complementaridade.Temos de potenciar isso e continuar a desempenhar este papel que é extremamente relevante», completa o responsável. Rui Vacas, da Nhood, concorda com esta perspetiva, mas descreve lojistas que optaram por reduzir área de loja, porque «uma expansão da marca nem sempre significa expansão de loja, e isto obriga-nos a pensar de forma diferente», nomeadamente a calcular as remunerações de outra forma.Já Telmo Ferreira, da Klépierre, está convicto de que «a integração das lojas nas operações logísticas das marcas é inevitável, nomeadamente na gestão de stock. A loja é o “last mile”, e o confronto não existe, nós aceitamos o fenómeno, entendemo-lo e integramo-lo». Na sua perspetiva, «o desafio é o caminho que temos de percorrer para saber o que a loja vale no seu todo, e não só na venda física, e é na tomada de consciência do negócio como um todo que podemos tomar boas decisões, chegando a consensos de parte a parte».O consumidor manda Em 2022, parece mais evidente que «é o consumidor quem manda», defende Sandra Campos, da C&W, para quem «a questão do online já nem se devia discutir, deveria estar mais que integrada». Nota que «a loja é hoje um espaço muito mais experienciado, que deve conhecer o seu cliente de forma quase intimista, o formato de entrar, comprar e ir embora tende a desaparecer». João Cristina, da Merlin Properties, concorda que «hoje é o consumidor que define o que quer e quando quer, o que altera completamente a dinâmica da cadeia de distribuição». Considera que «o grande desafio dos retalhistas é abraçar esta “omnicanalidade” e antecipar as necessidades do consumidor». Por outro lado, as lojas podem ser ainda mais úteis tendo em conta que «não é sustentável que todas as entregas sejam feitas porta a porta, e a logística inversa tem um custo enorme. Com a entrega em loja, a probabilidade de consumir é muito maior, e as lojas serão sempre beneficiadas». Pandemia evidenciou a “grande resiliência” dos centros comerciais Cristina Santos, Presidente da Associação Portuguesa de Centros Comerciais – APCC, confirma que o regresso aos centros comerciais depois de controlada a pandemia «tem sido surpreendentemente bom, os níveis de vendas estão acima de 2019 apesar de toda esta turbulência». E considera que «a Covid evidenciou a grande resiliência dos ativos, que souberam adaptar-se com rapidez». Está convicta de que a tendência vai continuar no próximo ano, «apesar de toda a incerteza», sendo certo que «tudo o que o setor puder fazer conjuntamente ao nível da partilha de ideias e soluções torna-nos mais fortes», defende. E assume que «a aceleração do online foi tal que colocou mais em evidência a importância das lojas físicas. Hoje, estamos mais sossegados do que estávamos antes da pandemia» no que toca à importância do físico. Eric van Leuven recorda que «os últimos anos foram muito atípicos» no que toca o investimento em centros comerciais, nomeadamente devido à grande maturidade do mercado português. E muitos dos investidores globais «são sediados em sítios onde o tema do reposicionamento é muito maior do que aqui, e o apetite não tem sido tão forte».Mas os investidores não perderam o interesse. Pedro Coelho, da Square AM, cujo portfólio de centros comerciais vale cerca de 250 milhões de euros, atesta que «estamos tão motivados hoje como há uns anos» para investir em centros comerciais. «Somos muito agnósticos no investimento, sempre que apareça um ativo interessante, vamos olhar para ele. Temos é de entregar sempre rentabilidade, porque todos os dias temos subscrições e resgates». “Navegação à vista” num 2023 mais contido Para Fernando Oliveira, «a única certeza» para 2023, é «a incerteza que temos pela frente». Comparando com outras crises anteriores, nota que, desta vez, «não temos desemprego, isso tem um grande impacto no rendimento disponível, e continuamos com dificuldade em contratar pessoas. O turismo mantém-se, e isto leva a uma incerteza ainda maior». Seja como for, acredita que «em termos reais, teremos um 2023 menos dinâmico que 2022, será uma navegação à vista», em que será necessária a «capacidade de tomada de decisões». Telmo Ferreira concorda que 2023 não será tão forte como 2022. E João Cristina recorda a «injeção de capital» feita durante a pandemia, e que «as taxas de juro dificilmente vão voltar ao que estavam, estarem negativas é contranatura». Acredita que é o preço do dinheiro que vai acabar por ditar as marés, e que «o investimento imobiliário tenderá a descer» em 2023. Rui Vacas assume-se mais preocupado com o impacto que o aumento das taxas de juro terá no crédito à habitação: «muitas famílias ainda não têm o crédito hipotecário atualizado, e o rendimento disponível será canalizado para pagar ao banco, o 2º semestre será muito difícil». Cristina Santos conclui convicta que «temos proatividade, capacidade de gestão e de fazer frente a estas variações», e refere que a APCC vai entrar em 2023 «com otimismo».

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