O VI Congresso da APEGAC, realizado entre os dias 11 e 12 de novembro na Fundação Oriente, em Lisboa, em conjunto com a II Feira do Condomínio, colocou em debate questões cruciais para a administração de condomínios, uma atividade essencial para o quotidiano de milhões de portugueses. Na abertura do evento, Vítor Amaral, Presidente da APEGAC, destacou a importância da associação na valorização da atividade, ao longo dos seus 20 anos de existência, referindo que a administração de condomínios, «atividade que é a última da fileira da construção e do imobiliário, é muitas vezes desvalorizada».
“A APEGAC tem tido um papel decisivo ao longo destes 20 anos na melhora da imagem do nosso setor de atividade perante a opinião publica e instituições”
O presidente da associação enfatizou que «a nossa atividade é a única que se mantém em toda a vida útil do edifício e é essencial para metade da população portuguesa que vive em condomínio, mas ainda é desvalorizada, tanto pela falta de compreensão da sua importância quanto pela recente profissionalização do setor». Embora reconheça os progressos feitos, Vítor Amaral apontou que ainda há desafios, nomeadamente no que toca à regulação. «Ainda não conseguimos que o legislador regule a atividade como gostaríamos, mas contribuímos de forma significativa para as últimas alterações ao Regime Jurídico da Propriedade Horizontal, embora algumas dessas mudanças ainda tenham ficado aquém do esperado», explicou.
“A formação foi a nossa maior bandeira ao longo destes 20 anos”
A formação contínua foi outro ponto fundamental na intervenção de Amaral, que destacou como a APEGAC tem impulsionado a profissionalização da atividade ao longo dos anos. Recentemente, a Direção Geral do Emprego e das Relações de Trabalho reconheceu a APEGAC como entidade formadora, «um passo fundamental para garantir a qualidade da nossa profissão», inferiu o presidente da associação.
João Vieira Lopes, Presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal, discursou também na abertura do congresso, reforçando a importância de valorizar o trabalho das empresas de administração de condomínios, que têm evoluído para lidar com a complexidade da atividade. «A atividade dos condomínios é complexa e nem sempre valorizada. A evolução da economia justifica a profissionalização de novos tipos de negócios e empresas. Temos de dar valor a estas empresas que estão a crescer e a enfrentar desafios complexos», afirmou.
Rui Florentino, Vogal do Conselho Diretivo Nacional da Ordem dos Arquitetos, fez questão de destacar a relevância da formação contínua, que «é essencial para desempenhar a profissão com qualidade». A Ordem dos Arquitetos «está aberta a parcerias para a formação profissional com a APEGAC, sabendo que há muitos desafios no futuro relativos à manutenção do edificado. Contem com os profissionais da arquitetura para a vossa atividade. Podemos colaborar para a formação dos profissionais».
Sustentabilidade e descarbonização dos edifícios
O tema da sustentabilidade e a descarbonização dos edifícios marcou a primeira mesa-redonda no VI Congresso da APEGAC, promovendo discussões entre especialistas sobre como os edifícios e os condomínios podem contribuir para a transição energética. Moderado por António Gil Machado, Diretor da Vida Imobiliária, o painel contou com intervenções de Duarte Bettencourt, Diretor Comercial B2C da EDP Comercial, Diogo Pinto Gonçalves, Vice-Presidente da APPII, Gonçalo Matos, da Bolsa dos Condomínios, e Sérgio Agra, CEO da Home Survey.
Sérgio Agra abriu a discussão refletindo sobre a realidade das assembleias de condomínio, onde a implementação de soluções de eficiência energética ainda enfrenta resistência devido ao custo, uma vez que «o condomínio vai olhar apenas para o valor final, de quando é que cabe a cada um pagar de cota extra». A eficiência energética «é uma necessidade» e «embora as soluções existam, são caras. No entanto, o retorno a longo prazo é considerável e trará benefícios ao condomínio», acrescentou.
Duarte Bettencourt destacou a relevância dos edifícios no consumo de energia, afirmando que representam 40% da energia primária total consumida. «É necessário transformar os nossos prédios em locais de produção solar», sublinhou, referindo que esta «é uma alteração de paradigma brutal que devemos acelerar e tornar real em cada prédio que temos». O representante da EDP apontou também a crescente procura por veículos elétricos e híbridos, destacando a urgência de adaptar os condomínios a essa nova realidade. «Estamos ainda muito longe de garantir a infraestrutura necessária para suportar», alertou.
Do ponto de vista da promoção imobiliária, Diogo Pinto Gonçalves comentou sobre a «importância de uma colaboração eficaz entre os vários agentes do setor», destacando que um «mau trabalho do promotor pode criar problemas na gestão dos condomínios». Para Diogo Gonçalves, o imobiliário em Portugal «ainda não é considerado um imobiliário verde». Do ponto de vista habitacional, «continuamos com leis que são de 1951, que nos obrigam a ter um conjunto de equipamentos que não fazem sentido para um edifício verde». Para «desenvolver um edifício mais verde deveríamos ter a capacidade de cortar algumas coisas que hoje não fazem sentido, mas que a lei nos obriga», avançou o Vice-Presidente da APPII.
Gonçalo Matos comentou que «é muito difícil conseguir convencer os condóminos a uma remodelação. Uma simples remodelação, como a pintura do edifício, já é difícil». Ao ser questionado sobre se os fundos públicos poderiam vir a ser um instrumento de aceleração, respondeu que «as pessoas, se tiverem uma comparticipação num investimento que têm de fazer, aceitam de braços abertos. Só que a questão burocrática que temos neste tipo de processos não ajuda», afirmou.
Sérgio Agra também falou sobre os fundos ambientais, destacando que, apesar de serem valiosos, ainda são insuficientes face ao tamanho do mercado, uma vez que «esses fundos têm valores à volta de 14 milhões de euros, mas são muito baixos para o tamanho do mercado», explicou, apelando a mais consciência por parte do Estado para acelerar a transição energética. Duarte Bettencourt reiterou a importância desses apoios, afirmando que «os fundos públicos são cruciais para acelerar a descarbonização e a eletrificação do setor». Por outro lado, Diogo Pinto Gonçalves enfatizou ainda que o mercado imobiliário começa a dar mais atenção à sustentabilidade, mas ainda há muito a fazer. «Os promotores estão cada vez mais preocupados com as questões ambientais, mas a legislação precisa de ser adaptada para que possamos substituir equipamentos obsoletos por soluções mais sustentáveis».
Viver em condomínio: a arte de gerir consensos
A manhã do segundo dia do VI Congresso da APEGAC foi marcada por uma mesa-redonda dedicada à gestão de condomínios, reunindo especialistas do setor para debater as complexidades da convivência e da busca por consenso entre os condóminos. A mesa-redonda foi composta por António Souto Pereira, sociólogo e presidente da Mesa da Assembleia Geral da APEGAC; Luís Pardal, da Síndicos Planning, do Brasil, trazendo uma perspetiva internacional sobre a gestão de condomínios; Rui Dória, da Pé de Galo, Administração de Condomínios, Lda; Nádia Magalhães, da N&N Condomínios e Jorge Pascoalinho, Solicitador. O debate foi moderado por Fernando Cruz, membro do Conselho Consultivo da APEGAC.
Nádia Magalhães, da N&N Condomínios, afirmou que a comunicação é a chave para gerir comportamentos. «A ferramenta mais adequada é a comunicação: falarmos com os condóminos», explicou, destacando que, muitas vezes, os residentes não compreendem o funcionamento da parte comum e o papel dos administradores. Para a responsável, «cabe a nós comunicar e entender as regras, fazer entender o que é viver dentro daquela pequena sociedade».
Luís Pardal trouxe uma perspetiva internacional, explicando as diferenças e semelhanças entre Brasil e Portugal no que toca à gestão de condomínios. «A minha empresa desenvolve há nove anos um trabalho focado na capacitação de síndicos e administradores de condomínios. Um dos principais objetivos é alcançar a convergência e o consenso entre as diferentes perspetivas presentes no condomínio. A pandemia trouxe dificuldades à gestão de pessoas retidas nos condomínios, mas também foi uma grande aprendizagem». No Brasil, «o trabalho do síndico e do administrador é complementar. Esta sinergia facilita bastante a conciliação de interesses, com o administrador desempenhando um papel fundamental na promoção da convivência e socialização entre os condóminos»
António Souto Pereira, sociólogo e presidente da Assembleia Geral da APEGAC, falou sobre a dificuldade do administrador de condomínio «em encontrar maneiras de reduzir os conflitos e incentivar o compromisso entre os condóminos». O consenso «é algo difícil de alcançar na totalidade, mas deve ser o objetivo. Assim, o compromisso torna-se a melhor solução, pois entre o que cada um deseja e o que se pode fazer, existe um ponto de equilíbrio, onde se encontra o meio termo mais viável», acrescentou. Para o responsável, o condomínio «deve ser um espaço onde a democracia participativa prevalece; a melhor decisão que uma assembleia toma é sempre mais acertada do que as ideias iniciais de cada um dos condóminos. Aí está o bom senso».
Jorge Pascoalinho, solicitador, reforçou a importância do respeito pelo administrador, sugerindo que «manter a comunicação em dia é essencial para a aceitação das intervenções». O responsável considera que «o objetivo deve passar pela diminuição dos conflitos, convencer os condóminos do que é importante para o coletivo, que se trata de uma valorização patrimonial e do investimento que ali fizeram. Esta é a função principal do administrador do condomínio». Rui Dória abordou a questão da formação contínua, mencionando o papel da APEGAC neste processo. «Perceber o que o condómino quer dizer, e não o que está a dizer, é essencial para chegar a um consenso», afirmou, frisando que é necessário um «mindset de criação de valor entre todos os condóminos».