Está clarificada a entrada em vigor da lei que isenta as lojas dos centros comerciais do pagamento da componente fixa da renda. A norma interpretativa foi esta terça-feira a votos, e define que a medida incluída no Orçamento Suplementar tem mesmo efeitos retroativos, devendo ser aplicada desde 13 de março: «aplica-se ao período compreendido entre 13 de março e 31 de dezembro 2020».
Segundo o Negócios, a proposta foi aprovada por um só voto, com 115 votos favoráveis, 114 contra e uma abstenção. PSD, BE, PCP, PAN e as duas deputadas não inscritas votaram a favor. PS, CDS e Iniciativa Liberal votaram contra, e o Chega absteve-se.
De recordar que esta proposta tinha sido aprovada pelo Parlamento na semana passada na generalidade, passando à Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, onde foi rejeitada na especialidade. Foi depois avocada para votação em plenário, onde foi agora aprovada.
Está em causa o regime excecional aplicável aos contratos de exploração de imóveis para comércio e serviços em centros comerciais, aprovado no âmbito do Orçamento Suplementar, que entrou em vigor a 25 de julho, que determina que os lojistas dos centros comerciais não devem «quaisquer valores a título de rendas mínimas até 31 de dezembro de 2020». Devem, sim, pagar a componente variável da renda e as despesas comuns.
Os lojistas defendiam a aplicação da lei desde março, data do início da pandemia, quando os centros tiveram de fechar devido ao Estado de Emergência. Mas os proprietários consideram que só deveria ter efeito a partir da sua entrada em vigor, em julho.
APCC pede envio da lei para o Tribunal Constitucional
À Vida Imobiliária, António Sampaio de Mattos, Presidente da APCC, afirmou que «a APCC entende que a lei agora aprovada é enferma de inconstitucionalidade, uma vez que se aplica a uma lei já de si inconstitucional, de acordo com o parecer de três renomados juristas e da Senhora Provedora de Justiça».
Afirma que «já solicitamos ao Senhor Presidente da República o envio da lei para o Tribunal Constitucional para fiscalização da sua constitucionalidade. Estamos, ainda, determinados em utilizar as demais vias judiciais de forma a que os nossos Associados sejam ressarcidos pelos prejuízos que daqui advenham».
Sampaio de Mattos recorda ainda que «tanto a lei agora aprovada, mas também a norma a que esta se reporta, garantem um desconto nas rendas que é muito superior à quebra de vendas que os lojistas efetivamente registam. E, também por isso, consideramo-la totalmente desproporcional naquilo que é a justa repartição dos sacrifícios», conclui.
A Associação Portuguesa de Centros Comerciais alertou já na semana passada que os seus associados «não hesitarão em processar o Estado, no sentido de serem ressarcidos dos prejuízos causados pelo inadmissível atropelo ao Direito, ao serem aprovadas leis desproporcionais e inconstitucionais». E lembra que «a retroatividade já tinha sido três vezes rejeitada em sede de Parlamento e refere-se a uma altura em que o setor se autorregulou (como tem feito sempre), pois há acordos entre os centros e 90% dos lojistas para este período em causa».
Já no início de dezembro, a Provedoria de Justiça pediu ao Tribunal Constitucional que declare inconstitucionalesta nova lei, no seguimento da queixa apresentada pela APCC, com base no parecer de vários constitucionalistas.
A Provedoria informou que «dirigiu ao Senhor Presidente do Tribunal Constitucional um requerimento pedindo que o tribunal declare a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma contida no n.º5 do artigo 168.ºA”, da Lei do Orçamento de Estado Suplementar (LOES). A Provedoria solicita ainda ao Tribunal Constitucional que seja atribuída prioridade na apreciação e decisão deste processo», pode ler-se no comunicado da APCC.
O setor imobiliário em geral foi-se manifestando frontalmente contra esta medida ao longo do ano. Uma das preocupações prende-se também com os efeitos para a visibilidade do país enquanto destino de investimento estrangeiro, já que a medida não tem paralelo na Europa, e muitos dos proprietários dos centros comerciais portugueses são fundos estrangeiros. Uma preocupação partilhada durante o último webinar da APPII.
Atualização às 13:30 de 23 de dezembro com declarações da APCC