Investimento: perspetivas são boas, mas a recuperação ainda não é para já

Investimento: perspetivas são boas, mas a recuperação ainda não é para já

«Comparativamente a outros mercados europeus, o Índice Imobiliário de Portugal não só exibiu uma das melhores performances em 2023 como tem um dos resultados mais estáveis no médio e longo-prazo», um comportamento que ajuda a explicar «a grande atratividade do mercado português», como refere Luís Francisco, Vice President, Real Estate Client Coverage do MSCI para a Ibéria, Holanda e Médio Oriente, falando na sessão de apresentação deste barómetro, que decorreu na manhã de 16 de abril no auditório da sede da PLMJ, em Lisboa, a que se seguiu uma mesa redonda de debate.

Em 2023, o imobiliário de rendimento monitorizado pelo MSCI (num total de 769 ativos, englobados em 39 portfólios com um valor global de 8.600 milhões de euros), gerou um retorno total de 6,8%. Excluindo o efeito dos investimentos realizados ao longo do ano, numa ótica de gestão ativa – que correspondem a apenas 5% da amostra – o retorno total dos designados «standing investiments» - isto é, aqueles ativos que estava nas carteiras desde o início do ano e que representam 95% da amostra – foi de 7%, dos quais 5.8% gerados pela componente de rendas, ao passo que o contributo da valorização de capital foi de apenas 1.2%.

«O crescimento das rendas impactou positivamente no desempenho do Índice em 2023, servindo para compensar o efeito da expansão das yields, que contribui negativamente para a valorização do capital», comentou Luís Francisco. De acordo com o responsável, esta conjugação de subida de rendas com a expansão de yields, mais acentuada na primeira metade de 2023, «foi o cenário dominante em praticamente todos os mercados europeus. A diferença é que, contrariamente ao que observámos em Portugal, nestes o ritmo de crescimento das rendas não foi suficiente para compensar o efeito negativo da expansão das yields na componente de capital».

Olhando em perspetiva, o responsável do MSCI não tem dúvidas que o bom comportamento do Índice ao longo dos últimos vinte anos ajuda a explicar a «grande atratividade» do mercado português.  Se em 2023, num ano especialmente desafiante para o setor, «os retornos da maioria dos mercados europeus monitorizados se mantiveram em terreno negativo, alguns dos quais exibindo mesmo os seus piores resultados de sempre. Portugal, pelo contrário, posiciona-se bem face aos demais, exibindo um retorno sólido e uma componente de valorização de capital positiva em 2023», E recuando ainda mais, «numa análise de médio-longo prazo, rapidamente constatamos que o Índice português é um dos mais estáveis a nível europeus».

Luís Francisco, Vice President, Real Estate Client Coverage do MSCI para a Ibéria, Holanda e Médio Oriente, falando na sessão de apresentação deste barómetro
Luís Francisco, Vice President, Real Estate Client Coverage do MSCI para a Ibéria, Holanda e Médio Oriente, falando na sessão de apresentação do Índice Imobiliário Português MSCI 2023

Hotéis e retalho na liderança

Tal como em 2022, o setor hoteleiro foi o que exibiu o melhor desempenho, gerando retornos totais de 10,5% aos investidores, seguindo-se o retalho, com 8,3%. «Mas, temos ainda a destacar o bom comportamento do setor industrial (6,5%), tal como a resiliência dos escritórios portugueses, cujo retorno apesar de ter descido dos 7,4% de 2022 se manteve em 5%, o que não deixa de ser um resultado muito positivo no atual contexto global, ainda para mais quando percebemos que foi sustentado pela subida de rendas», observa o vice-presidente do MSCI.

Comentando estes resultados, Paulo Silva, Head of Country da Savills Portugal, ressalvou que «os mercados operacionais de arrendamento estão muito fortes em Portugal, permitindo o excecelente desempenho de 2023 e estes resultados que conhecemos hoje».

 

Perspetivas são boas, mas a recuperação não é para já

Contextualizando os resultados do Índice Imobiliário Português em 2023, Luís Francisco lembrou que «na senda da tendência observada desde meados de 2022, o ano passado ficou marcado pela desaceleração dos volumes de investimento na Europa, que caiu para cerca de metade em termos homólogos», sendo que 2º trimestre registou o pior resultado em termos de capital transacionado no Velho Continente desde 2012. «Já levamos 18 meses de desaceleração da atividade, num cenário muito próximo do observado na Grande Crise Financeira de 2011m que se prolongou por 21 meses. Mas, este ciclo teve uma correção de valores muito mais rápida e acentuada do que nos ciclos anteriores», observa.

Nesta fase, «embora já estejamos no 5º trimestre consecutivo de estagnação em termos de volume de investimento à escala europeia, já vamos vislumbrando algumas notas de melhoria», diz, admitindo «algum espaço para otimismo». Ainda assim, diz o especialista, «para voltamos à normalidade no mercado, ou seja a um registo de maior atividade, ainda é preciso reduzir o desencontro de expetativas de preços entre vendedores e compradores, que continuam desalinhados».

De facto, atesta João Tenreiro Gonçalves, Co-founder e Executive Partner da Bedrock Capital Partners, em Portugal, «o repricing tem sido menor que lá fora, e alguns proprietários de ativos com bom desempenho operacional simplesmente não estão dispostos a baixar os preços devido à recente expansão das yields. E, creio que quando esse movimento de subida de yields cessar, essa solidez na performance operacional vai trazer de volta muitos investidores para o nosso país».

Ou seja, «as perspetivas são boas, mas as melhorias não são para já», resumiu Pedro Seabra, Senior Partner da Refundos Explorer. «O que acontece é que embora continue a haver capital, há também muita incerteza geopolítica e económica a nível internacional: temos duas guerras a acontecer em simultâneo junto às fronteiras europeias, e até as boas notícias relativamente à evolução das taxas de juro têm vindo a conta gotas; e tudo isto tem motivado os investidores a manter a sua posição wait and see», observa.

Além de que, como referiu Elizabeth Mathieu, Managing Director da Southcap, «os ativos imobiliários são menos líquidos comparativamente a outras classes de ativos mobiliários, e a sua avaliação market-to-market muitas vezes gera bastante dúvidas entre os investidores; além que a sua gestão implica maiores custos que, em alguns casos, correspondem a mais ou menos 10% da rentabilidade dos ativos. E, tudo isto tem levado à saída, ainda que temporária, de alguns investidores deste mercado».

Ainda assim, considera Jorge Teixeira, CEO do BPI Gestão de Ativos, «a onda que aí vem não sinaliza um abrandamento do mercado, pelo contrário. E, se a atual vaga do Wealth Management a que vamos assistindo lá fora também cá chegar, vai impactar muito positivamente no dinamismo do mercado imobiliário», comenta.

A  apresentação dos resultados foi seguida de uma mesa redonda de debate

Qualidade substitui a localização

Na leitura do responsável do BPI Gestão de Ativos há, contudo, algumas mudanças significativas na forma como os investidores olham para o imobiliário, e que devem ser tidas em conta. «Nos últimos anos, o mercado imobiliário tornou-se muito mais “quality”, ou seja, aquele velho jargão da “localização, localização, localização” já não faz sentido, se não houver qualidade». Além disso, nota, «a descarbonização está a impactar profundamente também nesta questão da qualidade dos ativos, nomeadamente na avaliação de risco que os investidores fazem». A digitalização é outro dos vetores de mudança, já que «a composição das empresas em bolsa, por exemplo, é hoje muito diferente do de antes, são mais qualificadas… e isso repercute-se em todo o tecido empresarial, e muda muito a forma como as empresas olham para os escritórios. E, em resultado, lidamos também com uma nova vaga de ocupação que nada tem a ver com a do passado, e que valoriza muito mais a qualidade dos espaços», remata.