Decorreu esta terça-feira, dia 1 de julho, a 3ª edição da Convenção APEMIP | IMOCIONATE, na Fundação Champalimaud, em Lisboa. A habitação foi um dos principais temas em destaque neste dia intenso de conferência, e ficou patente entre os especialistas que o problema do acesso à habitação em Portugal precisa não de uma, mas de várias soluções para ser combatido. Participando nesta convenção, o comentador Miguel Morgado recordou que o país não tem estruturas de gestão pública com dimensão ou capacidade para o que seria necessário. “Mas isso tem de mudar, porque a habitação tem de responder às necessidades da população. É imperativo construir mais casas, e temos de aprender como outros países enfrentaram os problemas”. E mostra-se otimista ao nível dos municípios: “mas precisamos de criar uma nova cultura de gestão”. Na sua apresentação sobre “Tecnologia, política e economia: os grandes choques de 2025”, Ricardo Costa, CCO do Grupo Impresa, Ricardo Costa afirmou que “o Governo vai ter de atuar do lado da oferta, e acredito que os governos europeus se vão apoiar em novos modelos de geometria variável”. Também deverá atuar ao nível do licenciamento, e seria importante impulsionar os transportes públicos “porque a solução é sempre um conjunto de soluções, que envolve o Estado, as autarquias, a banca. Com o tempo, vão ser abandonadas as soluções simplistas, felizmente”, e dá o exemplo do congelamento de rendas, “que só funciona em países onde o Estado é um grande proprietário". Arriscou-se a prever que o Governo completará o seu mandato de 4 anos, e que “vai acabar por atuar sobre o alojamento local, do ponto de vista funcional, com limitações futuras”. Acredita que “a pressão sobre as casas vazias também vai aumentar, nomeadamente do ponto de vista fiscal. E a médio prazo, o tema do aumento dos impostos sobre o património vai colocar-se por questões de equilíbrio das contas públicas”. Entrevistado no podcast do Expresso “Chave na Mão”, gravado em direto no evento, Isaltino Morais, presidente da Câmara Municipal de Oeiras, defende que é possível construir habitação com custos mais baixos, assim o Governo o decida, caso contrário, os preços vão continuar a subir. A chave pode estar nos terrenos, que têm de ter preços mais baixos â partida. “Os promotores precisam de terrenos a custos acessíveis. Primeiro que tudo, temos de libertar solos. Os governos não têm sido capazes de se focar, e deixam os promotores e os senhorios pagar a crise”. Apela a que os políticos olhem para os modelos de construção de habitação pública dos anos 90, e também para o longo prazo, não apenas para o seu mandato. Políticas de habitação têm décadas de atraso Num painel dedicado ao “Futuro da Habitação”, Marina Gonçalves, ex-ministra da Habitação, no anterior Governo socialista, defendeu que “os políticos têm de tentar encontrar soluções robustas, porque falhou uma política estrutural de habitação. Se tivéssemos tido políticas nas últimas décadas, hoje teríamos outros instrumentos. Também temos de responder no curto-prazo, tendo em conta que, sem medidas do lado da oferta, temos um aumento exponencial dos preços. E sabemos todos que não se resolvem os problemas da habitação estalando os dedos”. Considera que as recentes recomendações feitas pela Comissão Europeia ao país, concorde-se com elas ou não, “significam que está a ver a habitação como um problema importante na Europa. Precisamos da partilha de boas-práticas, de conhecimento e ensinamentos”. Por seu lado, Manuel Reis Campos, presidente da CPCI e da AICCOPN, recordou que “o Estado construiu 8.700 habitações nos últimos 20 anos. Praticamente não se construiu nem se reabilitou, e em 2021 (segundo os Censos) precisávamos de 136.800 fogos para deixar de ter carências habitacionais. Precisamos agora de habitação do Estado”. Avança que “o setor tem capacidade para fazer o que é necessário para o país, mas precisamos de novos regulamentos, incentivos e menor carga fiscal. A mudança do RJIGT é positiva, mas é preciso que as autarquias atuem. Todos sabemos o que é preciso fazer, temos é de agir”. O gestor António Ramalho reiterou que existe um problema de acesso à habitação no nosso país, e que é necessário “entender as falhas de mercado”, nomeadamente o facto de a prestação assumida pelas famílias se desviar cada vez mais dos seus rendimentos. "Esperemos que não se desviem demasiado, porque se um dia perdermos a possibilidade de vender fogos usados, acaba a capacidade de transação do mercado”. “O grande problema é o salário médio” Participando no evento, Paulo Portas, ex-vice-primeiro-ministro, criticou o facto de a discussão do problema da habitação “partir do princípio de que se pode resolver rapidamente”. Mas há muitas variáveis a ter em conta, como as grandes mudanças das cidades, que “parecem mudar mais do que as pessoas”. No caso de Lisboa, recorda que “já cresceu para onde tinha de crescer” em termos geográficos, e questiona se “devemos discutir o crescimento em altura”. Num país com “grande cultura de proprietários”, hoje “é mais fácil fazer crédito à habitação do que crédito às empresas. E como os juros já estão a descer, é óbvio que isso volta a colocar a procura em alta”. Não duvida que “já sabemos quais são as causas do problema, nomeadamente a redução da oferta. Não posso ampliar a oferta acessível se construo muito menos”. E para construir mais, é necessária celeridade. “Na vida, tempo é dinheiro, e o mesmo acontece na construção. O tempo que os licenciamentos levam, implica remunerações de capital altíssimas. Quanto mais tempo o licenciamento demorar, mais caro será o preço”. Defende a baixa do IVA na construção, e também se mostra contra o controlo das rendas: “desincentiva o crescimento de que precisamos para aumentar a oferta. As cidades podem começar a decair”. Seja como for, está convicto de que “o grande problema é o salário médio líquido português”, e que são necessários novos acordos dos parceiros sociais, e melhorar a produtividade do país.