Sustentabilidade

Sustentabilidade: o tempo de agir é agora!

Não há tempo perder no plano de ação do imobiliário rumo à sustentabilidade, que tem de ser transversal a toda a sua cadeia de valor. O tempo de agir é agora, e quem ficar para trás enfrentará maiores dificuldades em transformar o esforço necessário a esta transição numa equação económica favorável…

Susana Correia 06 Maio 2024

Este foi o sentimento dominante no final do encontro promovido pela Vida Imobiliária no passado dia 17 de abril, em Lisboa, que reuniu à mesa do pequeno-almoço um restrito grupo de profissionais para debater como o imperativo da sustentabilidade se está a propagar ao longo cadeia de valor do imobiliário português. Sob o mote «O novo paradigma de investimento imobiliário», o evento contou com o apoio da Schneider Electric e da Savills, que nos recebeu nos seus escritórios no MB4 Office Building, um espaço pioneiro em sustentabilidade.

«A sustentabilidade é um tema a que somos muito sensíveis na Savills, que tem como meta atingir a neutralidade carbónica em 2025. Há já alguns anos que orientámos a nossa estratégia em função desse objetivo, que esteve na base da decisão de mudarmos a nossa sede para este edifício», começou por explicar Paulo Silva, Head of Country da consultora para Portugal. Um edifício de autor da década de 80, o MB4 Office Building foi totalmente reabilitado através de um projeto desenvolvido pela equipa da Savills, que o posicionou na linha da frente da sustentabilidade energética e da proteção ambiental. «Vamos ter a certificação BREAM in Use – Excellent no nosso edifício sede, o que comprova que fazendo o investimento certo, com as apostas certas em termos e sustentabilidade, conseguimos criar um produto que, do ponto de vista económico, devolve um retorno superior ao seu proprietário. O MB4 tem rendas cerca de 15% a 20% acima do praticado no seu entorno, porque graças ao projeto que aqui foi desenvolvido conseguimos transformar um edifício com 40 anos num ativo muito competitivo, e pelo qual as empresas estão dispostas a pagar uma renda um pouco mais elevada, para nele poderem ter os seus escritórios», observou.

Claro que «ajuda ter um rácio económico que justifique as medidas de reabilitação sustentável», reconhece Paulo Silva, frisando, contudo, que «felizmente ainda estamos num contexto favorável, pois conseguimos introduzir soluções sustentáveis que se traduzem em economias significativas na operação do edifício e em melhorias ao nível do bem-estar dos seus utilizadores, através de uma equação favorável, em que o retorno financeiro vai de encontro à preocupação ambiental. Mas, receio que se não formos rápidos a implementar hoje este tipo de medidas, num futuro assim não tão distante, as medidas necessárias para uma reabilitação sustentável implicarão um maior esforço económico». Por isso, avisa, «este é o momento de agir!»

Certificação é condição para fechar negócio

Ação é, precisamente, a palavra de ordem no seio do Grupo AGEAS Portugal que, tendo «a sustentabilidade como premissa» está atualmente a certificar todo o seu portfólio de ativos imobiliários, que engloba desde escritórios a centros comerciais e student housing, e cujo ativo mais antigo é a Expo Tower, com 25 anos, que, contudo, «já tem grande parte renovada», como contou Ricardo Medeiros, Construction & Real Estate Manager do grupo segurador belga no nosso país. Neste sentido, com o apoio da Savills, o grupo segurador definiu como meta a obtenção do selo BREAM in Use para 90% do seu portfólio, sendo que «os novos escritórios sede em Lisboa e no Porto, terão certificação BREAM Excellent, e nosso edifício na rua Castilho será o primeiro em Portugal a ser certificação BREAM Refurbishment», realça o responsável. Isto porque o certificado já é um requisito obrigatório para a AGEAS na hora de fechar negócio, já que «qualquer novo investimento que fazemos, muitas das vezes em projetos ainda em desenvolvimento através de um modelo de forward funding, tem sempre de ser num ativo com certificação», admite.

Mas essa é apenas uma das faces da estratégia de sustentabilidade da AGEAS no imobiliário, que está também muito focada «em controlar e a otimizar seus consumos energéticos, enquanto aposta na compra de energia 100% verde», o que, sublinha Ricardo Medeiros, «é uma peça importante que ajuda à descarbonização».

Efeito de cascata já começou…

Pela natureza da sua atividade e do grupo que faz parte, a AGEAS é uma das entidades que já tem de obedecer aos novos requisitos de reporte impostos pelo Green Deal e pelo Sustainability Finance Reporting (SFR), que «estão aí e terão um efeito cascata em todo o mercado. Pois, como as entidades do setor financeiro já estão a ser escrutinadas pelo lado do risco, geram uma pressão enorme sobre toda a sua cadeia de valor, fazendo com que as pequenas empresas também tenham de mergulhar cada vez mais na sustentabilidade, realçou Tiago Carrilho, Head of Sustainability do BCSD Portugal, frisando que «esta é a tendência».

Neste novo cenário, «a forma como as empresas estão a operar e fazem a gestão de risco terá de ser revista, para proteger a atividade no futuro», alerta o especialista. Assim, continua, «as empresas que quiserem abraçar a competitividade e a resiliência terão que implementar a sustentabilidade não só na gestão dos seus ativos, como aquando da sua construção e aquisição, para conseguirem ir recolher esse valor de uma forma estratégica – seja ao nível da própria gestão de risco, seja ao nível da competitividade, Porque, cada vez mais, do lado dos investidores é certo que procuram por empresas que tenham a sustentabilidade bem implementada não só naquele que é o seu core estratégico, mas também na forma como fazem e usam os edifícios» , rematou Tiago Carrilho.

Mercado residencial demora mais a responder

Na perspetiva de Tiago Belo, Chief Operating Officer da Solyd, «os investidores estão muitíssimo preocupados com as questões relacionadas com os riscos climáticos e o impacto ambiental, da avaliação da dupla materialidade, e por aí fora, e nesse contexto, por vezes torna-se mais fácil encontrar o equilíbrio entre a questão económica e a preocupação ambiental na hora de investir, pois isto já está instalado na sua estratégia. Mas, para quem produz habitação para venda à classe média isso não é tão simples, pois os compradores ainda não estão tão conscientes para a necessidade e importância da sustentabilidade, e para o valor acrescentado que esta confere ao imóvel». Partilhando a sua experiência, o responsável conta que «podemos contar pelos dedos de uma mão quantos foram os clientes que, nos nossos primeiros cinco anos de atividade, nos perguntaram qual seria a classe de certificação energética da casa, por exemplo». Ainda assim, admite, «hoje já é evidente uma mudança, e temos efetivamente um cliente muito mais informado e preocupado com estas questões do que antes, mas o que acontece é que em muitos dos casos este tem uma capacidade limitada do ponto de vista económico, não tendo capital adicional disponível para poder pagar essas mais valias».

Ou seja, resumiu Nuno Fideles, Head of Sustainability da Savills, «temos aqui duas cadeias em velocidades diferentes. De um lado a dos imóveis comerciais e operacionais, destinados a investidores, cujos projetos também permitem maior flexibilização. E, de outro lado o residencial, onde tudo, inclusivamente a certificação, ainda é comparativamente mais difícil».

Corroborando esta visão, Cristina Oliveira, Diretora de Programas & ESG da VIZTA, adiantou que «estamos a dar os primeiros passos para a certificação BREAM de um projeto [residencial], mas até aqui tudo o que nos é apresentado ainda é custo e este é um processo muito longo e complicado… Enquanto no mercado de escritórios, é mais evidente o retorno de uma certificação BREAM e das medidas que têm de ser tomadas para a sua obtenção, no mercado residencial o caso ainda é muito diferente. Tanto que, numa primeira amostragem, as medidas que fazem mais sentido considerando o nosso cliente final, que é a classe média, são insuficientes para chegar a uma classificação Good; fazendo com que tenhamos de estar permanentemente a estudar e a avaliar esse equilíbrio. É um processo muito longo, existindo algum receio de o desvirtuar quando o projeto entra em construção».

Cristina Oliveira, Diretora de Programas & ESG da VIZTA
Cristina Oliveira, Diretora de Programas & ESG da VIZTA
Indústria da construção ainda resiste à mudança

Para o responsável da Solyd, «a sustentabilidade é um tema que tem de ser incorporado ao longo de todo o ciclo de produção imobiliária, partindo do projeto e que deve passar pela estandardização, sistematização e industrialização da construção, que irá permitir poupanças significativas de emissões de carbono e tornar essa promoção muito mais eficiente. Além disso, nos nossos projetos tomamos um conjunto significativo quer de medidas passivas quer ativas, seja para tornar as casas muito mais eficientes do ponto de vista energético e hídrico, seja do ponto de vista do próprio conforto; permitindo ao nosso cliente final ter uma casa que não só é mais eficiente, como mais agradável para viver, como um todo».

Ainda que o recurso à construção industrializada seja uma meta para a VIZTA, «como trabalhamos para um segmento de mercado médio, ainda não conseguimos acompanhar os valores da construção industrializada, que é mais cara comparativamente à tradicional. Embora nos nossos projetos tentemos sempre ir atrás das soluções industrializadas, o que acontece é que damos dois passos à frente aquando da conceção do projeto, mas quando chega à hora de avançar só conseguimos efetivamente avançar um» afirma Cristina Oliveira, reconhecendo, contudo que «para que esses custos baixem efetivamente, o mercado tem de avançar». Por enquanto «já estamos a prosseguir com alguma construção industrializada, através de soluções produzidas offsite», no projeto Flower Tower, em Matosinhos. «Na primeira torre, devido ao fator custo tivemos de abandonar a pré-fabricação e recorrer à construção tradicional, pois não podemos olvidar que trabalhamos para um público muito sensível ao preço, que é a classe média. e, como tal, temos de gerir muito bem os custos para não encarecer o produto final».

O que acontece, diz Tiago Belo, é que «do lado dos empreiteiros ainda há uma grande resistência a esta mudança, o que muitas das vezes leva a uma avaliação incorreta daqueles que são os custos de alternativa. Mas, para que esta aconteça, a filosofia e o mindset para executar a obra tem de mudar!». Se «com a industrialização é exigido um enorme trabalho prévio de estandardização e otimização logo na fase de projeto», em contrapartida «com construção tradicional temos um sistema muito demorado e complexo, que implica a entrada de muito mais especialidades, demora mais tempo e produz mais resíduos…». Posto isto, diz, «se avaliarmos os custos diretos de cada uma das componentes, sem dúvida que a construção tradicional será a mais barata, mas quando somamos todos os custos indiretos relativos a tempos de obram custos de gestão de estaleiro, e etc… o caso muda de figura, e é precisamente aí que estão grandes poupanças da industrialização», conclui.

Monitorizar para poupar

Nuno Fideles, chamou ainda a atenção para o facto que «na sustentabilidade, monitorizar os edifícios é um ponto muito importante, pois é a forma como percebemos onde podemos vir a ter problemas. Não basta olhar para a eficiência energética sob o prisma dos equipamentos mais eficientes e das fontes da energia consumida por esse edifício. Conhecer a maneira como gastamos a energia e a água é também muito importante, para que esses edifícios sustentáveis possam ter mecanismos para limitar e controlar esse consumo».

«Essa componente de otimização e redução do consumo é mesmo muito importante, pois prolonga-se ao longo de todo o ciclo de vida do imóvel», acrescenta Cláudio Costa, Responsável pela área de Promotores Imobiliários e Arquitetos na Schneider Electric. Por isso, refere, «é preciso uma visão de médio e longo prazo, de modo a percebermos quais serão as tecnologias e soluções que dispomos hoje, que serão mais eficientes no futuro».

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Diana Nigra

Diretora WIRE Portugal e CEO INARKUS