Os centros comerciais continuam a mostrar a sua força e importância no mercado português. Adaptando-se às novas tendências, retomaram os níveis pré-pandemia e hoje estão entre as principais classes de ativos no que toca ao investimento, prometendo manter esta reinvenção constante, que é chave para a atividade. Este foi o tema do mais recente Pequeno Almoço Conferência que a Vida Imobiliária organizou a 20 de novembro em Lisboa, com o apoio da Dils, da Sonae Sierra e da Schneider Electric. Carla Pinto, diretora executiva da APCC, destacou neste encontro que, no ano passado, os centros comerciais em Portugal registaram 650 milhões de visitas, valor que poderá ser ultrapassado já este ano, e que já está acima dos patamares pré-pandemia. Para a responsável, “o que me inspira é a forma como estes centros funcionam, porque mais do que centros de comércio, os shoppings são hoje cada vez mais hubs multifuncionais, como um verdadeiro resort”. Ao longo dos anos, tem sido notório para os profissionais o poder de transformação dos centros comerciais. “Nas nossas conversas com os investidores, sobressai sempre o poder e a qualidade da gestão. No fim de contas, isso é que tem assegurado a resiliência. E continua a ser um dos segmentos mais robustos do imobiliário comercial em Portugal”, afirma Marlene Tavares, da Dils. “Depois da pandemia, é bom ver que os centros comerciais estão de volta, este ano dominam o investimento, isto porque temos uma excelente indústria de centros comerciais em Portugal, nomeadamente de Grade A, que atraem muita gente, pela grande qualidade que têm. Há saúde nesta indústria”, afirma Pedro Lancastre, CEO da Dils. Novos públicos, muitos segmentos Paulo Ferreira Gomes, diretor do Centro Comercial Colombo, em Lisboa, assinala que a hiper segmentação marca a atualidade dos centros comerciais, “principalmente nas camadas mais jovens. E tem de ser muito bem feita. O refurbishment que estamos a fazer no Colombo vai nesse sentido, queremos simplificar o edifício para que o layout seja mais bem compreendido e seja fácil de encontrar os espaços que se pretende visitar”. Carla Pinto destacou que, além de pensar nas várias faixas etárias dos públicos-alvo, é preciso ter em conta a heterogeneidade da população. “temos mais 1,5 milhões de habitantes no país, oriundos de todo o mundo, com muitas culturas e nacionalidades diferentes. Há adaptações que têm de ser feitas”, nomeadamente na restauração. Seja como for, “hoje o comportamento do consumidor é mais difícil de prever. Podemos usar a IA para perceber melhor o que se passa nos centros comerciais, para perceber e gerir essa comunidade”. Generoso Mateus, diretor do Almada Forum, destaca que “esta nova população tem justificado o volume de vendas que estamos a conseguir manter acima da média. Os nossos centros em Portugal são dos que melhor trabalham o produto do centro comercial, e vemos as várias culturas perfeitamente integradas nestes espaços de lazer porque, acima de tudo, o nosso produto é muito bom”. Atesta que o número de visitas está próximo dos valores pré-pandemia, mas as vendas já ultrapassaram largamente esses patamares. E se é certo que algumas visitas se evitam com um pedido de Glovo ou Uber, porque permitem “jantar fora em casa”, a verdade é que os serviços de delivery já entram nas contas das vendas das lojas dos centros comerciais. Rui Sanches, CEO do grupo Plateform, identifica que a restauração tem ganho relevância nos centros comerciais, e que as dietas já não são meras franjas de mercado, mas sim “mini segmentos, e é aí que nos especificamos. Inclusive, já temos pratos disponíveis que não estão no menu, mas que permitem adaptar às necessidades do cliente sem tornar os menus demasiado grandes”. O delivery lança desafios ao nível dos espaços. “O cliente está a consumir em casa, e as calas do restaurante podem ficar mais vazias e com menos ambiente, por isso talvez não precisemos de ter tantos restaurantes, mas flagships de maior dimensão, porque o delivery passa a cobrir os bairros aos quais não conseguimos chegar, ou onde não se justifica ter um restaurante”. Abraçar a mudança, o quanto antes Paulo Ferreira Gomes está convicto de que “se podemos apontar algum defeito aos centros comerciais em Portugal é o facto de termos perdido muito tempo a olhar para a digitalização do negócio como uma ameaça”. Algo que aconteceu também com as plataformas de entrega, que “durante algum tempo foram encaradas também como ameaças, mas hoje são encaradas como parceiros. As vendas são contabilizadas para o centro e temos mesmo alguns operadores que estão a melhorar as suas performances graças a estas plataformas. Caso contrário, poderiam até ter deixado de estar presentes no shopping. E por isso mesmo temos criado melhores condições para os estafetas, como lounges próprios com majoração do sinal do wifi”. Generoso Mateus também afirma que “o centro comercial é quase um escritório do delivery, a empresa beneficia das nossas infraestruturas em termos de conforto, instalações sanitárias. Pode haver uma transação entre o lojista e essas plataformas, mas o hub somos nós”. Incorporar as necessidades do online é também útil, e o Colombo está a reparar um hub de cacifos para levantamento de encomendas “com características especiais, para que os clientes possam levantar as suas encomendas com segurança, conforto e estacionamento”, segundo Paulo Ferreira Gomes. Luís Loureiro, CEO da Widerproperty, confirma a crescente interligação dos shoppings com o ecommerce e refere que “atualmente, os serviços veem nos shoppings boas plataformas de distribuição, não só pelo conforto e acesso a estacionamento, mas sobretudo pelas estruturas de acesso e circulação otimizadas, ou pelo horário diferenciado”. Carregamento elétrico é fator de atratividade para o centro comercial Ter um ponto de apoio à mobilidade elétrica é uma mais-valia clara para um centro comercial. É o que afirma Luís Sykes, Key Account Manager da Schneider Electric. “Na nossa empresa, encontramos várias velocidades na implementação deste tipo de infraestrutura” que tem por trás “toda uma infraestrutura invisível com a qual o centro tem de se preocupar e, muitas vezes, do lado dos proprietários existe a vontade de primeiro medir o pulso ao mercado antes de fazer um investimento pesado. Depois, temos uma outra questão: hoje quase não se constroem centros comerciais, e a maioria dos que existem têm vinte anos ou mais, e as suas infraestruturas elétricas e afins foram pensadas nessa altura”, aponta. Mas “há vários modelos de comercialização dos postos de carregamento – podem ser explorados diretamente pelo centro, ou podem ser explorados por terceiros e, aí, o centro só tem de se preocupar que assegura o fornecimento de energia”. Luís Loureiro concorda que pontos de carregamento elétrico “são, sem dúvida, um qualifyer para um centro comercial”, e Paulo Ferreira Gomes acredita que “o grande limitador não é a falta de vontade, mas sim a capacidade da rede”. Generoso Mateus concorda que “muitas vezes, temos operadores dispostos a investir eles próprios no posto de transformação, e sem dúvida que esta é uma valência que nos interessa e que é geradora de valor para o centro comercial”. Um mercado maduro que precisa de investimento cíclico João Cruz, da Dils, destacou que “temos um parque de centros comerciais relativamente maduro e até envelhecido, de certa forma, com uma exigência intensiva de CAPEX que é cíclica. É preciso investir para manter o ‘look and feel’ do centro sempre atualizado, e o orçamento tem de ser bem gerido”. Seja como for, “o mercado está relativamente estabilizado. Houve uma reafirmação do F&B depois da pandemia, entraram novos grupos e houve muita diversificação”. Entre os novos players estão também a Normal, a Pepco ou a Primor, com “um fator disruptivo muito interessante”. Marlene Tavares destaca que “em termos de consumo, o nosso país continua muito ancorado nos centros comerciais, que continuam a ser os grandes motores do consumo na maior parte das cidades fora de Lisboa e Porto”. Nuno Nunes, CIO da Square Asset Managemnet, partilhou a visão da gestora neste encontro, dando nota de que está satisfeita com a sua atual carteira de retalho e que a ideia é comprar mais centros comerciais: “são uma classe de ativos especial, tiveram má publicidade durante muito tempo, por causa da morte anunciada do retalho, que não aconteceu, e há dois ou três anos voltou a aumentar o investimento neste segmento. Os novos investidores são especialistas, sabem investir e gerir retalho, que é um setor que tem muito mais operação do que escritórios ou logística, por exemplo”. Pedro Lancastre confirma que “este ano, os centros comerciais representam 38% do investimento comercial em Portugal, é a principal classe de ativos, à frente dos hotéis e muito à frente dos escritórios. É um investimento que está na moda, e do ponto de vista da utilização nunca deixou de estar. Além disso, os nossos centros comerciais são realmente bons e têm muita qualidade”. Luís Loureiro destaca a importância da gestão de expetativas dos investidores, que “variam muito consoante o seu perfil”. A empresa trabalha com vários tipos de investidor, e especializa-se no reposicionamento de centros comerciais: “claro que há todo um conjunto de variáveis que precisam de ser trabalhadas, um shopping que esteve parado durante vários anos não tem uma solução mágica no curto prazo. Daí que seja tão importante a gestão de expetativas”.