Mercado imobiliário vai continuar a valorizar, apesar das subidas dos juros

Num contexto de taxas de juro em alta, e depois de recordes de valorização em 2022 e com um crescimento homólogo dos preços de 14% até maio, o mercado da habitação português continua a mostrar-se resiliente, e as expetativas são de manutenção da valorização, ainda que a um ritmo menos intenso.Esta foi uma das principais conclusões do debate “Home Market 23/24”, parte da 1º Convenção APEMIP|IMOCIONATE, que decorreu esta terça-feira no CCB, em Lisboa, para debater os principais desafios e o futuro do mercado imobiliário. Ricardo Guimarães, diretor da Confidencial Imobiliário, chamou à atenção para um contexto de «muito pouco volume de oferta e grande nível de procura, a par de baixos rendimentos das famílias portuguesas», que tem resultado numa «grande taxa de valorização da habitação, porque o mercado deixou de ser só Lisboa, e passou a ser mais diversificado», com as maiores subidas a registarem-se nas cidades médias do país.Segundo o Sistema de Informação Residencial da Confidencial Imobiliário, as vendas de habitação, que vinham a perder gás, voltaram a subir nos últimos 3 meses, o que Ricardo Guimarães considera «um espelho de uma alteração do sentimento de mercado», já que «o principal fator impulsionador do investimento é a expetativa de não desvalorizar, e hoje temos o consenso de que o imobiliário não vai desvalorizar. Era um receio que existia», nomeadamente durante a pandemia, mas que não se comprovou.Mas o atual contexto é desafiante para o país. Traçando algumas perspetivas para a economia nos próximos meses, o professor e economista João Duque destacou a «grande alteração do enquadramento» devido à subida das taxas de juro para controlar a inflação, o que faz antever um abrandamento das economias a nível europeu, mas Portugal deverá continuar com uma boa performance, muito graças aos recordes que o setor do turismo continua a bater. Assim, a nossa economia deverá crescer cerca de 2,5% até ao final do ano. E, segundo prevê, «pode haver efetivamente uma redução pelo menos das taxas de valorização do património, o que não significa desvalorização».Já as taxas de juro, não deverão descer, ainda que se aguarde a sua estabilização. O gestor e consultor internacional António Ramalho recorda que o período de taxas de juro negativas dos últimos anos não se vai repetir, e que a subida «era inevitável», apesar de ter sido conduzida de forma relativamente rápida, o que está a resultar no controlo da inflação: «isto não quer dizer que as taxas de juro desçam, acho que vão manter-se nestes níveis durante um longo período de tempo». E guia-se pela taxa de juro a 10 anos, que está nos 3,08% há cerca de um ano. Por isso, «podemos contar com taxas de juro de curto prazo no mínimo de 2,5%».O gestor mostra-se confiante num setor imobiliário «extraordinariamente bem sucedido em Portugal», com o maior número de proprietários, em proporção, na Europa. E «se mesmo durante a troika não tivemos uma crise de crédito à habitação, seguramente agora não vamos ter», remata.Habitação acessível e sustentável? Para Lisboa, é “um e o mesmo desafio”A conciliação entre a grande necessidade de habitação acessível e a igualmente urgente necessidade de melhorar as condições energéticas e de sustentabilidade do parque edificado português foram um dos principais temas em destaque nesta convenção da APEMIP.Conciliar as duas, principalmente em momentos de crise, não é fácil, mas Filipa Roseta, vereadora da Habitação da Câmara Municipal de Lisboa, garante que «estamos a responder com o pé no acelerador», e que «a nossa Carta Municipal de Habitação vai levar estes desafios ao limite, porque queremos habitação acessível com grande eficiência energética. Construir mais habitação, só faz sentido nesta linha».Para o efeito, a autarquia já assinou com o IHRU um contrato de financiamento de 800 milhões de euros, dos quais 500 milhões de euros proveem do PRR e cerca de 300 milhões de euros do orçamento municipal. Por isso, construir habitação acessível sustentável «é possível, sim, pois temos um orçamento camarário de mais de 200 milhões de euros, que compara com os 14 milhões de há 10 anos atrás», recorda. Hoje, «a habitação é a nossa primeira prioridade, e tem de ser necessariamente conjugada com a eficiência energética, é um e o mesmo desafio».Também a Madeira tem vindo a investir na habitação. Pedro Calado, presidente da Câmara Municipal do Funchal, admitiu que a região autónoma que hoje recebe mais de 9.000 dormidas ao longo do ano e cada vez mais nómadas digitais, o que «faz aumentar o preço da habitação. Além disso, tivemos uma grande lacuna de construção nos últimos anos e hoje uma grande falha de oferta». Além disso, «temos de adaptar o nosso parque habitacional a uma nova necessidade energética, e só este ano investimos cerca de 2 milhões de euros na remodelação total de dois bairros». Ressalva que «o Funchal tem hoje habitação à venda por 10.000 euros por metro quadrado, mas pior que a falta de oferta de habitação são os rendimentos baixos das famílias. A habitação disparou muito acima da capacidade das famílias».Seja como for, «não podemos adiar mais o caminho da sustentabilidade», diz o investigador Manuel Collares Pereira, e «temos de olhar para o setor do imobiliário de uma forma séria, porque 41% das emissões de CO2 vêm dos edifícios». Está certo de que «existem hoje muitas soluções técnicas para isto, sobretudo para o comportamento energético dos edifícios, nomeadamente a possibilidade de usar outros materiais naturais e orgânicos, como a madeira, que é sequestradora de CO2». E dá o exemplo da sua empresa, a Vanguard Properties, que «não vai investir de forma que não seja sustentável».Admitindo a necessidade absoluta de ter uma economia mais sustentável, Roberto Colomer, diretor geral da UCI Portugal e presidente da EMF, é mais cético quanto às metas europeias e à nova diretiva para a sustentabilidade dos edifícios, que deverá ser aprovada antes das próximas europeias. «Os desafios de aplicabilidade são enormes», acredita, nomeadamente tendo em conta o desafio de reduzir para 50% as emissões dos edifícios até 2030 ou torná-los “net zero” em 2050: «a quantidade de dinheiro necessária para atingir estes objetivos é enorme, tenho muitas dúvidas de que seja fácil atingir este objetivo. Terá de ser através de um trabalho conjunto entre o setor público e o privado».Marina Gonçalves reforça “trabalho de parceria” com o setor imobiliárioEncerrando a Convenção APEMIP | IMOCIONATE, a ministra da Habitação, Marina Gonçalves reforçou a necessidade de «parceria com este setor», considerando que «é relevante para o setor participar no debate, dar a sua opinião». A sua presença na convenção «é mais um passo neste trabalho de parceria e de comunidade que temos de fazer em prol de um setor tão importante como o do imobiliário e da habitação».Falando sobre o tema da tecnologia, muito debatido durante a conferência, recordou que «o Estado também pode ganhar com a tecnologia e com os frutos do trabalho desenvolvido nos últimos tempos», recordando que «o pacote “Mais Habitação” tem ferramentas para chegar a mais gente e bebe muito do trabalho que o setor faz no seu dia-a-dia, nomeadamente com este tipo de ferramentas».«Deixo-vos uma mensagem de reforço da importância deste trabalho de diálogo e parceria para promovermos política pública»«Deixo-vos uma mensagem de reforço da importância deste trabalho de diálogo e parceria para promovermos política pública, porque o setor que representam é fundamental para estas políticas de habitação, e contamos também convosco neste trabalho. Não estamos, de todo, em polos opostos, trabalhamos para o mesmo, e devemos focar-nos nas parcerias e naquilo que podemos desenvolver em conjunto. Queremos continuar a discutir com o setor e a estar presentes, num diálogo aberto e franco», conclui a ministra.“Todos ganharemos mais se pudermos estar juntos”Esta convenção focou-se no debate do futuro do mercado imobiliário. Na abertura, Paulo Caiado, Presidente da APEMIP, recordou que o setor tem «grandes desafios em mãos, uns globais, outros internos, alguns que não controlamos, mas temos de dar o nosso melhor para resolver alguns deles. Separa-nos o facto de sermos concorrentes, mas estamos aqui para falar sobre o que nos une». E está convicto de que «será indispensável ao nosso desenvolvimento e futuro percebermos que temos de confiar mais uns nos outros. Empresas grandes ou pequenas, todos temos de entender que ganharemos mais se pudermos estar juntos». Por outro lado, num mercado extremamente concorrencial, não deixou de ressalvar que «não aceitaremos modelos que procurem romper em absoluto o valor dos nossos serviços».E conclui que «a APEMIP quer conquistar espaço e ser um elo aglutinador do nosso setor. Teremos todos de ser mais exigentes no que diz respeito ao comportamento ético e transparente exigível às nossas empresas e às boas práticas que serão indispensáveis para implementar».

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