Portugal continua a fazer progressos na diminuição do crédito que está em incumprimento no sistema financeiro nacional, mas o ritmo de redução deste tipo de empréstimos está mais lento. Em Portugal, a venda de portfólios de crédito em incumprimento (Non-Performing Loans (NPL) deve fixar-se nos 1,4 mil milhões de euros em 2023, numa diminuição de 18% face ao ano transato, posicionando a atividade como uma das mais baixas dos últimos anos, estima a Prime Yield na edição de 2023 do seu research “Investing in NPL in Iberia”.
A travagem no investimento deste tipo de ativos reflete a conjugação da redução da dimensão média das carteiras que surgem em oferta e um cenário de relativa estagnação na entrada de novos processos de venda, ao mesmo tempo que o mercado secundário não se encontra desenvolvido.
Portugal contraria a tendência agregada na Europa
Entre abril e junho, os bancos nacionais contabilizavam 6.300 milhões de euros em crédito malparado nos seus balanços, menos 1.200 milhões de euros do que em igual período do ano passado. Deste volume, apenas 17%, equivalente a cerca de 200 milhões de euros, estão concentrados em 2023. Apesar disso, Portugal permanece entre os países que reduziu o stock de NPL no 2º trimestre face ao trimestre anterior, contrariando a tendência agregada na Europa, que evidencia um aumento trimestral do crédito em incumprimento.
Na Europa, o volume de NPL no 2º trimestre somou 361.000 milhões de euros, aumentando 1% face ao trimestre anterior, equivalente a mais 3.930 milhões de euros. De acordo com Francisco Virgolino, Managing Director da Prime Yield, «apesar de a tendência europeia ser já de algum aumento do stock de NPL, em termos trimestrais, Portugal ainda está entre os países que continuam o seu processo de redução. Mas, mesmo nesse contexto, vemos que há uma maior resistência da queda face ao passado recente. Dos €1.200 milhões de NPL retirados do sistema financeiro nacional no último ano, 2023 contribuiu com uma fatia de apenas €200 milhões».
Segundo a Prime Yield, outro dado importante é o peso que o crédito malparado tem no total do crédito concedido. Este indicador, chamado de rácio de NPL, tem evoluído também de forma muito favorável, passando de 8,9% em junho de 2019 para os atuais 3,0%. Sem prejuízo desta melhoria, o rácio português continua acima da média europeia, onde o crédito malparado representava, no 2º trimestre de 2023, 1,8% dos créditos ativos no sistema financeiro. Portugal continua a ser um dos países europeus onde o crédito malparado tem maior peso sobre o crédito total.
Maior fatia de malparado está concentrado no crédito às empresas
A maior fatia de malparado em Portugal está concentrado no crédito às empresas, 62% do total, no valor de 3.900 milhões de euros. Este volume reduziu 5% face aos 4.100 milhões de euros registados no trimestre anterior. Já o crédito em incumprimento nas famílias ascendeu no período em análise aos 2.200 milhões de euros, equivalente a 35% do total, mas não registou qualquer redução face ao trimestre anterior.
No segmento do crédito malparado a particulares, 45% diz respeito a financiamentos à habitação, subsegmento onde o malparado também não reduziu em termos trimestrais, mantendo-se inalterado em cerca de 1.000 milhões de euros. Numa evolução mais de médio prazo, contudo, quer as famílias quer as empresas mantiveram a curva decrescente, com reduções homólogas de NPL de 8% e 19%, respetivamente, no 2º trimestre de 2023. No crédito à habitação, o malparado caiu 9% em termos homólogos.
Transações de crédito malparado travam
Como referido, o estudo calcula que o mercado de venda de crédito malparado atinja este ano os 1.400 milhões de euros, travando 18% face a um 2022 já bastante incipiente. O nível de atividade projetado para 2023 supera apenas o do ano 2020, quando foram transacionados pouco menos de 1.000 milhões de euros, refletindo um mercado paralisado devido à pandemia.
De referir ainda que está ativa uma operação de grande dimensão, a venda da Algebra Capital, a qual abrange uma carteira de malparado na ordem dos 4.200 milhões euros. Este negócio tem uma escala inédita no mercado português e não deverá ser concretizado este ano, mas reveste-se de caraterísticas diferentes dos negócios habitualmente contabilizados, pois envolve a venda da empresa de gestão e recuperação de créditos e não apenas da carteira de malparado.
«Em resultado da tripla circunstância de ter menos portfólios, mais pequenos e com menos garantias, o mercado de venda de NPL em Portugal tem perdido alguma atratividade no contexto internacional. Isto, num cenário global em que há uma mudança do perfil dos investidores, com muitos operadores que eram compradores ativos a afastarem-se deste mercado. O facto de a recuperação do crédito malparado estar mais difícil devido à conjuntura económica, os financiamentos para as operações de maior dimensão serem mais limitados e de serem necessários mais recursos para extrair valor dos portfólios adquiridos estão a afastar alguns investidores», explica Francisco Virgolino.
O responsável acrescenta que «excluindo o potencial negócio da Algebra Capital, é difícil avançar expetativas para a transação de NPL para o próximo ano, dado que, por um lado, não se antecipa um aumento, pelo menos um aumento expressivo, na massa de crédito falido e, por outro lado, Portugal não tem um mercado secundário ativo. De qualquer forma, para já há um crescente interesse pela compra de carteiras com créditos em risco, uma vez que a Banca tende a antecipar a venda de crédito antes que entre em incumprimento. A médio prazo poderá ser expectável um aumento do crédito incumprido, especialmente entre as famílias e no segmento de crédito à habitação, em efeito da perda de poder de compra em contexto de elevadas taxas de juro».