Build to Rent destinado à habitação acessível pode ser a chave para o sucesso

O modelos de parceria público-privada em Lisboa e no Porto estiveram em destaque no primeiro dia do Portugal Real Estate Summit. Filipa Roseta, vereadora da Habitação da Câmara Municipal de Lisboa, e Pedro Baganha, vereador do Urbanismo da Câmara Municipal do Porto, apresentaram as suas estratégias para desenvolver mais habitação acessível, em parceria com os investidores privados. Filipa Roseta sublinhou a urgência de aumentar a oferta de habitação como a prioridade máxima da autarquia. «Queremos aumentar a oferta de todos os quadrantes, a pública, privada, todas», afirmou, enfatizando que a capital tem potencial para crescer com projetos conjuntos. «Queremos construir 3.000 habitações públicas e temos outras 4.000 para desenvolver com privados», nomeadamente através do novo modelo de concessão de terrenos, para construção de habitação acessível. «Temos terrenos públicos disponíveis por 90 anos, com os projetos já aprovados – não precisam de esperar por aprovações», reiterou. A vereadora apelou ao interesse dos investidores em pensar a longo prazo, referindo-se a exemplos de sucesso nórdicos: «Olhem para a Noruega, Suécia, e outros países nórdicos, onde isto funciona. Começaram com menos de 100 unidades, hoje têm 100.000». Destacou ainda que o objetivo principal é atrair jovens e famílias, criando projetos com um impacto social significativo, nomeadamente com habitações acessíveis. Porto quer aumentar oferta pública de 2% para 10% nos próximos seis anos Já no Porto, Pedro Baganha apontou a escassez de habitação acessível, especialmente para a classe média, como o grande desafio. «Sabemos que a única solução possível para resolver a atual crise é criando mais oferta», disse, revelando a ambição de aumentar a oferta pública de 2% para 10% nos próximos seis anos. Apesar desse esforço, reconhece que «não será suficiente», pelo que a autarquia tem um modelo de Build to Rent ativo, baseado em arrendamento e subarrendamento. Um dos projetos mais ambiciosos será a transformação da zona de Campanhã num novo polo de centralidade e a construção da primeira linha de TGV que ligará o Porto a Lisboa. «Sabemos o que acontece com todas as cidades que ganham este tipo de infraestrutura: mudam definitivamente», reforçou. A cidade está a disponibilizar terrenos públicos, criando oportunidades para o desenvolvimento de habitação acessível com segurança para os investidores. «Propomo-nos ser os inquilinos dos investidores por 10 anos – nós assumimos a renda junto dos proprietários». O vereador assegura que o mercado de Build to Rent oferece condições favoráveis e que a cidade do Porto está preparada para acolher mais iniciativas deste tipo. Investidores discutem futuro da habitação na Península Ibérica A mesa redonda moderada por Roger Cooke, MBE FRICS, Conference Chairman, contou com a participação de Alberto Nin Garaizabal, Managing Director da Brookfield Asset Management, Manuel Ibáñez, Head of Real Estate Iberia da DWS, Hilke Nijmeijer, Senior Portfolio Residential Manager da CBRE IM, Christopher Hütwohl, CEO da Nook 42, e Marten Foxon, Head of Hospitality da Arrow Global. A discussão focou-se nos desafios e oportunidades de investimento no mercado residencial e de arrendamento na Península Ibérica. Alberto Nin Garaizabal destacou os desafios do mercado português, particularmente no setor do Build to Rent. «O capital não é particularmente audaz, e enfrentamos muitos custos e dificuldades, sobretudo devido a uma legislação imprevisível. As yields são bastante apertadas, o que envia um sinal claro aos investidores para não apostarem no BTR», disse. Além disso, sublinhou a importância da liquidez, enfatizando que «os investidores precisam de liquidez. Se o setor habitacional não se tornar mais atrativo, o capital será canalizado para outras áreas». "Segmentos alternativos, como as residências de estudantes, podem aliviar a pressão sobre o mercado habitacional" Na mesma linha, Christopher Hütwohl defendeu que os segmentos alternativos, como as residências de estudantes, podem aliviar a pressão sobre o mercado habitacional. «Esta oferta é complementar. Não deve ser uma ou outra. É possível desenvolver habitação acessível através de projetos que criem comunidade, como unidades mais pequenas», referiu. Manuel Ibáñez revelou que a DWS tem investido fortemente na habitação acessível em Espanha, mas ainda não está pronta para investir em Portugal. «Não estamos nem perto de investir em habitação acessível em Lisboa ou no Porto. Neste momento, estamos a competir com outras geografias, e o binómio risco-retorno faz com que concentremos o nosso capital noutros locais», explicou. Para Hilke Nijmeijer, a regulação não é o verdadeiro problema, mas sim a sua imprevisibilidade. «As pessoas têm tanto receio da regulação, mas em si mesma é normal. Na Holanda, temos regulação há muitos anos e funciona bem. O que cria receio é a falta de previsibilidade», afirmou. Acrescentou ainda que «Lisboa não está na nossa prioridade agora, mas se pudermos investir por 3% sem risco, porque não?». "O que não podemos ter é um excesso de regulação associado a problemas de licenciamento" Marten Foxon partilhou a sua experiência em Madrid, onde uma regulação clara se revelou um fator decisivo para o investimento. «Em Madrid, a regulação é bem definida e o retorno era suficientemente atrativo para nós. O que não podemos ter é um excesso de regulação associado a problemas de licenciamento», sublinhou. Destacou ainda que, para o mercado português, a aposta em modelos de utilização mista (mixed-use) pode representar uma solução viável. «Valorizamos os fundamentos em Portugal, mas é crucial desbloquear mais oferta no mercado». A questão da liquidez e da previsibilidade legislativa foi um dos temas mais debatidos, com Hilke Nijmeijer a destacar que «se houver pouca liquidez na estratégia de saída, como no caso de um horizonte de 15 anos, isso terá de ser compensado por yields mais elevadas, especialmente no contexto do BTR». «O desafio da estabilidade na regulação não é exclusivo de Portugal, mas há muitas questões a equacionar: as yields são altas, os impostos elevados, e o risco associado aos prazos de licenciamento é enorme», observou Alberto Nin Garaizabal. Com uma visão otimista, mas cautelosa, Manuel Ibáñez concluiu que o mercado ibérico se encontra numa fase competitiva. «Estamos a competir com outras classes de ativos em diferentes geografias. O arrendamento livre ainda enfrenta dificuldades para competir com o modelo de Build To Sell, mas o Build to Rent destinado à habitação acessível pode ser a chave para o sucesso, desde que existam mecanismos de compensação, como a disponibilização de terrenos a custo zero, subsídios de renda ou licenciamentos garantidos» Build to Rent e a sua viabilidade no mercado imobiliário português Na apresentação conjunta "From Affordable Housing to New Living Models", Paula Sequeira, Head of Consultancy & Valuation da Savills, Gemma Kendall, Head of Multifamily Investment, International Capital Markets EMEA - JLL, e Dominic Orchard, Associate Director Operational Capital Markets da Savills UK, abordaram o Build to Rent (BTR) e a sua viabilidade no mercado imobiliário português, comparando-o com outros países europeus onde este modelo já está mais consolidado. O principal entrave à expansão do BTR em Portugal reside nos custos elevados de construção e nos prolongados tempos de licenciamento. Segundo os intervenientes, o Governo tem feito esforços para resolver esta questão, mas a estabilidade legislativa também é uma peça-chave que necessita de maior atenção. No atual cenário, o mercado português ainda está muito dependente da propriedade privada, ao contrário de países do Norte da Europa, onde o BTR é já uma realidade consolidada. A escassez de habitação acessível é um problema estrutural no país. Com uma média anual de apenas 20.000 novas casas a serem construídas, o défice habitacional é cada vez mais evidente, sobretudo em cidades como Lisboa, onde as taxas de esforço atingem os 52% – muito acima dos 15% a 30% considerados saudáveis. Outro desafio identificado para o BTR em Portugal é a liquidez do mercado. Muitos investidores que operam neste segmento em Espanha e noutros países europeus mostram-se reticentes em apostar em Portugal. Além disso, a rentabilidade no mercado de venda é significativamente superior à do arrendamento, o que leva muitos promotores a optarem por vender os seus projetos em vez de os manterem para arrendamento. A previsibilidade legislativa e a limitação de riscos são fatores cruciais para que o mercado de BTR ganhe tração, sendo fundamental afinar algumas questões relacionadas com o regime fiscal e a regulamentação das rendas.

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