Três novos instrumentos de habitação serão lançados até ao final do ano

A estratégia para a habitação vai contar com várias linhas de apoio, entre as quais o empréstimo de 1.340 milhões de euros acordado com o Banco Europeu de Investimento e a garantia de 2,5 mil milhões de euros do Banco de Fomento às câmaras municipais. Na conferência “Habitação Acessível e Industrialização: Escalar Soluções com Propósito”, organizada esta quarta-feira pelo Grupo Casais, Gonçalo Regalado, presidente da Comissão Executiva da instituição, apresentou as medidas em preparação para reforçar o financiamento à habitação. Com o objetivo de partilhar com a audiência aquilo que foi apresentado este mês de setembro pelo Governo e que ainda está em fase de aprovação, Gonçalo Regalado salientou que “existe sempre um intervalo entre a apresentação, a aprovação e depois a disponibilização ao mercado dos principais instrumentos para apoiar tanto a habitação pública como a privada em Portugal”. O primeiro passo passou por ajustar os estatutos do banco: “o banco não tinha enquadramento legal para financiar habitação pública, não fazia parte do seu core business, nem das suas prioridades. O que está agora a ser colocado na nossa responsabilidade é semelhante ao que acontece noutras áreas de apoio à economia, sendo a habitação pública uma das principais”. Até ao final do ano, vão ser lançados cinco instrumentos de habitação em Portugal, “com uma densidade bastante material”, dois dos quais já apresentados. O primeiro instrumento que ficou definido trata-se de um modelo de financiamento através de crédito direto do Banco Europeu de Investimento às Câmaras Municipais, ou seja, “foi definido um conjunto de 12 mil casas e, nessas 12 mil casas, ficou estabelecido - já com uma resolução do Conselho de Ministros aprovada - que cerca de 25% do custo seria coberto como subvenção. As câmaras municipais recebem assim 25% a fundo perdido, enquanto os restantes 75% são financiados diretamente pelo Banco Europeu de Investimento”. Portanto, este é o primeiro instrumento que vai agora ser ultimado para ser colocado ao serviço das câmaras municipais, “permitindo construir habitação acessível com 25% de incentivo a fundo perdido e 75% de financiamento bancário a muito longo prazo (25 anos). Esse é o primeiro objetivo”. Câmaras vão ter garantia de 2,5 mil milhões Depois há um segundo objetivo que são as Estratégias Locais de Habitação, referiu Gonçalo Regalado. “Estamos a ultimar o modelo que queremos lançar já em outubro, no qual vamos convidar os bancos comerciais a disponibilizarem um plafond para financiar as câmaras municipais a 25 anos, com garantia pública de 90%. Por exemplo, se um banco tiver 300 milhões de euros, será atribuída uma garantia pública de 270 milhões. No entanto, ficará contratualizado que existe uma taxa de perda de 5%, ou seja, dos 300 milhões apenas serão cobertos 15 milhões em perdas”. “Há uma garantia pública de 90% do financiamento. O plafond inicial do primeiro concurso é de 2,5 mil milhões de euros, apenas para o ano de 2026. Assim, vamos ter vagas contínuas desta dimensão, permitindo às câmaras municipais o acesso ao mercado bancário com soluções muito competitivas, a prazos muito alargados, que possibilitam também à banca comercial oferecer um pricing bastante competitivo e, sobretudo, com garantia”. Linha para apoiar as parcerias público-privadas Gonçalo Regalado destacou ainda a criação de um programa de parcerias público-privadas (PPP) para a habitação, em que o Estado disponibiliza o terreno e o licenciamento, e o promotor privado assegura a construção e, eventualmente, a gestão. “Estas PPP vão permitir um licenciamento mais ágil e financiamento garantido”. Quanto a este produto que está a ser apresentado ao mercado, esclareceu: “não é um produto com 90% de garantia, porque a garantia não é dada à Câmara Municipal, mas sim ao promotor. Será uma garantia de cerca de 50%. Não vamos dar um portfólio que permita ter apenas 5% de perdas, porque sabemos que, no setor privado, a perda pode ser superior e, no histórico, já houve perdas bastante diretas. O que podemos admitir é uma perda até 10% em cada portfólio de cada banco” “Aquilo que nós aqui estamos a desenhar é um programa que permita que, nestas quatro linhas centrais, a habitação pública em Portugal, com promoção da venda privada e com a ativação do privado, possa concretizar a ambição do país, que é construir cerca de 133.000 casas nos próximos anos. Essa é a grande ambição”, enfatizou Gonçalo Regalado. “Hoje em dia já é claro para todos que ninguém faz nada sozinho e precisamos, de facto, do conhecimento de todos e de quem está no terreno para conseguirmos alicerçar políticas concretas e com resultados positivos” A secretária de Estado da Habitação, Patrícia Costa, fechou a conferência defendendo que as soluções para a crise da habitação só serão eficazes através de um trabalho conjunto entre Governo, setor e ordens profissionais. A crise na habitação resulta da conjugação de vários fatores: “se agregarmos este desinvestimento de décadas na habitação ao aumento do custo de vida, à subida dos preços dos materiais de construção, à escassez de mão de obra e à emigração, percebemos porque é que o acesso à habitação é hoje tão complicado”. Defendeu, assim, que “não há nenhuma bala de prata para resolver o problema da habitação. Não existe. Temos de trabalhar em toda a dimensão”. Entre as medidas, destacou a remoção de bloqueios regulatórios, nomeadamente no uso do solo e no planeamento urbano. “Não vai haver habitação acessível, a valores moderados, se nós não conseguirmos ter terrenos mais baratos”. Também a regulamentação da construção está em revisão. “Falamos da vulnerabilidade sísmica, da construção modular como modelo de referência e da revisão das condições técnicas das edificações e do Código da Construção. Naturalmente, não é um trabalho isolado, é feito com todo o setor, porque não vale a pena fazermos uma simplificação por decreto que não tem respaldo na realidade da obra”. Patrícia Costa lembrou ainda o trabalho feito na revisão do regime jurídico da urbanização e edificação. “Era importante olhar para este regime e adequá-lo às necessidades de hoje e à evolução tecnológica. No final do dia, todos sabemos que tempo é dinheiro. A previsibilidade na resposta é fundamental para concretizar investimento”. O arrendamento urbano foi outro dos pontos destacados. “Importa que os programas sejam de fácil utilização, tanto para os arrendatários como para os investidores. O arrendamento urbano tem de ser entendido para todo o perfil das nossas famílias: desde as mais vulneráveis, no arrendamento apoiado, até àquelas que hoje também têm dificuldades no acesso à habitação”. A revisão da portaria da construção pública também mereceu destaque, uma vez que “estava completamente descredibilizada pelo desfasamento entre o custo de produção e o valor real. Foi atualizada para majorar a eficiência energética e as intervenções em áreas de reabilitação urbana. Este instrumento já prevê IVA a 6% e custos controlados, permitindo definir regras que maximizem a oferta e minimizem custos de produção”. “Precisamos de construir mais rápido e mais barato, sem perder qualidade” Para Patrícia Costa, “vivemos hoje uma revolução industrial na construção. A mudança de paradigma é clara: já não construímos apenas para famílias historicamente carenciadas. Toda a gente que hoje precisa de casa a custos moderados é diferente - seniores, famílias monoparentais, profissionais deslocados, famílias numerosas. Precisamos de construir mais rápido e mais barato, sem perder qualidade”. “Este caminho tem de ser feito em conjunto” Na abertura da conferência, António Carlos Rodrigues, CEO do Grupo Casais, sublinhou que “por mais capacidade que a indústria tenha, não consegue colocar projetos no terreno se não houver investimento a curto prazo que tenha impacto durante décadas”. Num discurso dirigido também ao setor, reforçou a necessidade de colaboração, salientando que “isto não se faz sozinho. Temos trabalhado com muitas empresas parceiras e as nossas próprias empresas estão disponíveis para o mercado. Este caminho tem de ser feito em conjunto”. Destacou ainda o percurso da Casais na aposta em modelos de construção industrializada, digital e integrada, rejeitando a ideia de que isso signifique abandonar a construção tradicional. “Ela vai continuar a existir e nós próprios continuaremos a trabalhar nela durante muitos anos. O que somos é contra o desperdício”, explicou. No entanto, o modelo tradicional já não permite grandes ganhos de eficiência. “Com a falta de mão de obra e as dificuldades nas cadeias logísticas, já não conseguimos espremer mais da laranja. Quando optamos por uma construção modular volumétrica conseguimos produzir muito mais em fábrica, mas, por outro lado, encontramos dificuldade em adaptar essa solução a todos os projetos. Através de uma abordagem por componentes, conseguimos maior capacidade de adaptação a diferentes tipologias de projeto”. Garantiu ainda que a industrialização não compromete a arquitetura: “não se trata de limitar a criatividade, mas de garantir qualidade, segurança, flexibilidade e eficiência. Podemos obter edifícios únicos, mesmo quando utilizamos componentes industrializados”. Quando falamos de sustentabilidade,“falamos também de poupança. Essa poupança traduz-se em eficiência, em mais lucro para as empresas, mas sobretudo em maior acessibilidade para quem quer comprar uma casa”, sublinhou.

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