Desde meados do ano passado, os grupos parlamentares dos diversos partidos políticos com assento na Assembleia da República apresentaram sucessivas propostas de alteração ao regime do alojamneto local. Da discussão na especialidade resultou o texto de substituição dos Projetos de Lei n.º 524/XIII (PS), 574/XIII (PCP), 653/XIII (BE) e 723/XIII (PAN), aprovado em votação final global, no dia 18 de julho, e que introduz várias alterações ao regime, com novas limitações e obrigações para quem já explora ou quer vir a explorar esta atividade.
Uma das principais alterações, e que já tinha sido anunciada pelo Governo, tem a ver com o reforço dos poderes dos municípios, que vão passar a poder estabelecer quotas máximas de estabelecimentos de alojamento local, por freguesia, identificando «áreas de contenção». De acordo com o texto final aprovado, a fim de «preservar a realidade social dos bairros e lugares», as Câmaras Municipais podem, através de regulamento municipal e com deliberação fundamentada, aprovar «a existência de áreas de contenção, por freguesia, no todo ou em parte, para instalação de novo Alojamento Local, podendo impor limites relativos ao número de estabelecimentos de alojamento local nesse território, que podem ter em conta limites percentuais em proporção dos imóveis disponíveis para habitação». As áreas de contenção identificadas por cada município deverão ser comunicadas ao Turismo de Portugal, I.P. e devem ser reavaliadas de dois em dois anos, considerando a evolução das áreas identificadas. Recebida a comunicação, o Turismo de Portugal introduzirá a referência à limitação de novos registos nestas áreas no Balcão Único Eletrónico. A instalação de novos estabelecimentos de alojamento local nestas áreas de contenção ficará dependente de autorização expressa da Câmara que, em caso de deferimento, promoverá o respetivo registo. Nas áreas de contenção identificadas, «o mesmo proprietário apenas pode explorar um máximo de sete estabelecimentos de alojamento local». Por outro lado, até à entrada em vigor do regulamento municipal que delimite as áreas de contenção, os municípios poderão «por deliberação fundamentada da assembleia municipal, sob proposta da câmara municipal, suspender, por um máximo de 1 ano, a autorização de novos registos em áreas especificamente delimitadas», de modo a «evitar que a alteração das circunstâncias e das condições de facto existentes possa comprometer a eficácia do regulamento municipal».
Mais poderes para os condomínios
Além dos municípios, também as assembleias de condóminos passam a ter um papel mais ativo na fiscalização da atividade do alojamento local. Assim, no caso de a atividade ser exercida numa fração autónoma de edifício ou parte de prédio urbano suscetível de utilização independente, a assembleia de condóminos poderá, por decisão de mais de metade da permilagem do edifício, opor-se ao exercício da atividade na referida fração, no caso de se verificar a «prática reiterada e comprovada de atos que perturbem a normal utilização do prédio, bem como causem incómodo e afetem o descanso dos condóminos». A «deliberação fundamentada» da assembleia de condóminos deverá ser comunicada ao Presidente da Câmara Municipal territorialmente competente, a quem caberá decidir sobre o pedido de cancelamento do registo do respetivo estabelecimento. Caso seja decidido o cancelamento e a consequente cessação da exploração, tal implicará a impossibilidade de o imóvel em causa ser explorado como alojamento local por um período a fixar na decisão, nunca superior a 1 ano, independentemente de haver alteração da entidade exploradora.
O diploma determina, ainda, que não poderá haver instalação e exploração de “hostels” em edifícios em propriedade horizontal em que coexista habitação sem autorização dos condóminos, devendo a respetiva deliberação instruir a mera comunicação prévia com prazo dirigida ao Presidente da Câmara Municipal para efeito de registo do estabelecimento.
Os condomínios vão também poder fixar o «pagamento de uma contribuição adicional correspondente às despesas decorrentes da utilização acrescida das partes comuns, com um limite de 30% do valor anual da quota respetiva», mediante disposição do regulamento de condomínio, aprovada sem oposição por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio. Por outro lado, ficarão a cargo do titular do alojamento local as despesas com obras que sejam realizadas nas partes comuns para adaptar ou licenciar a fração para esse fim.
Novas obrigações para os titulares da exploração
O titular da exploração passará a ser solidariamente responsável com os hóspedes pelos danos provocados por estes no edifício em que se encontra instalada a unidade. Para o efeito, o titular da exploração deverá «celebrar e manter válido um seguro de responsabilidade civil que cubra riscos de incêndio e danos patrimoniais e não patrimoniais causados a hóspedes e a terceiros por sinistros ocorridos no exercício da atividade». A ausência deste seguro é fundamento de cancelamento do registo do alojamento.
Tornar-se-á também obrigatório que todos os alojamentos locais tenham um Livro de Informações, em português e inglês e, pelo menos, em mais duas línguas estrangeiras, sobre o funcionamento do estabelecimento e respetivas regras de utilização, nomeadamente sobre o funcionamento dos eletrodomésticos, ruído e cuidados a ter para evitar perturbações que causem incómodo e afetem a tranquilidade e o descanso da vizinhança, devendo também incluir o contacto telefónico do responsável pela exploração. No caso de o alojamento estar inserido em edifício de habitação coletiva, o Livro de Informações deve incluir também o regulamento com as práticas e regras do condomínio que sejam relevantes para o alojamento e para a utilização das partes comuns, devendo o responsável do estabelecimento disponibilizar ao condomínio o seu contacto telefónico.
Passa também a ser obrigatório, em todos os estabelecimentos de alojamento local, exceto na modalidade de «moradia», a afixação de uma placa identificativa junto à entrada do estabelecimento, obrigação que, atualmente, apenas recai sobre os «estabelecimentos de hospedagem».
Nova modalidade «quartos» e registo por mera comunicação prévia com prazo
O registo do estabelecimento de alojamento local passará a ser efetuado mediante mera comunicação prévia, com prazo, dirigida ao Presidente da Câmara Municipal. Poderá haver oposição à comunicação prévia se, num prazo de 10 dias contados da sua apresentação ou num prazo de 20 dias no caso dos «hostels», o Presidente da Câmara territorialmente competente se opuser fundamentadamente ao registo.
É criada a nova modalidade de alojamento «quartos», que corresponderá aos casos em que a exploração do alojamento local seja feita na residência e domicílio fiscal do locador. Nesta nova modalidade, a unidade de alojamento será o quarto e apenas será possível ter um máximo de 3 unidades. Os «estabelecimentos de hospedagem» e os «quartos» poderão usar comercialmente a designação de «Bed & breakfast» ou de «guest house».
Sanções mais pesadas em caso de incumprimento
O novo regime prevê coimas mais pesadas para alojamentos não registados ou com registos desatualizados, para a comunicação intempestiva da cessação da exploração, ou para a violação da capacidade máxima dos estabelecimentos, entre outros casos. Estas contraordenações vão passar a ser punidas com coima de 2.500 a 4.000 euros (o limite anterior era de 3.740,98 euros), no caso de pessoa singular, e de 25.000 a 40.000 euros (o limite anterior era de 35.000 euros), no caso de pessoa coletiva.
As Câmaras Municipais passarão a ter competência, juntamente com a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), para fiscalizar o cumprimento das regras aplicáveis ao alojamento local, assim como para instruir os respetivos processos e aplicar as respetivas coimas e sanções acessórias.
Entrada em vigor e regime transitório
O novo regime entrará em vigor 60 dias após a sua publicação, mantendo-se válidos os registos de alojamentos locais realizados até essa data. As alterações relativas a condições de acesso à atividade e requisitos de instalação apenas serão aplicáveis aos estabelecimentos de alojamento local que se instalem após a entrada em vigor da nova lei. Os estabelecimentos já existentes irão dispor de um prazo de dois anos, a contar da entrada em vigor do novo regime, para se conformarem com os restantes requisitos previstos no mesmo.