Paulo caiado encerra ciclo na apemip com balanço “muito positivo”
Ver Revista >>Um mercado sem regras não é livre, é frágil
Uma economia verdadeiramente livre não é sinónimo de ausência de regras; é, antes, o resultado de um equilíbrio cuidadoso entre liberdade e responsabilidade. Quando este equilíbrio falha, instala-se a assimetria: alguns jogam com rigor e transparência, outros movem-se num território sem exigências mínimas.
No setor imobiliário português, esta realidade é cada vez mais evidente – e, para mim, insustentável.
Todos os anos, milhares de famílias e empresas confiam a compra, venda ou arrendamento de património significativo a profissionais que, muitas vezes, não são formalmente obrigados a provar qualquer preparação técnica, jurídica ou sequer ética.
Entram no mercado num dia e, no seguinte, estão no terreno a intermediar decisões de elevado valor económico e emocional. Uma informalidade estrutural que já não acompanha a complexidade de um setor que representa uma parcela relevante da economia nacional.
Enquanto os mediadores licenciados enfrentam obrigações rigorosas – em matéria de branqueamento de capitais, RGPD ou formalização contratual –, qualquer pessoa pode exercer funções idênticas sem certificação individual, atuando sob a “sombra” de uma licença empresarial. O sistema responsabiliza a empresa, mas deixa a figura do agente quase invisível perante a lei. É um modelo que fragiliza a confiança e penaliza quem atua de forma séria.
Regulamentar a atividade individual é uma necessidade lógica e previsível de um mercado que amadureceu mais depressa do que o seu enquadramento legal.
Um setor que movimenta milhões não pode continuar a de- pender de mecanismos de controlo frágeis, nem de um quadro legal desenhado para uma realidade que já não existe.
Em paralelo, há quem defenda que a fixação de comissões imobiliárias seria uma solução para reduzir custos para os consumidores. À primeira vista, a ideia soa apelativa. Na prática, é profundamente redutora.
Se todos os restaurantes fossem obrigados a servir menus a um preço único ou se todos os advogados tivessem honorários tabelados, o resultado seria menos diversidade, menos inovação e, previsivelmente, menos qualidade. O mesmo se aplica à mediação imobiliária: a livre concorrência é um pilar que permite aos consumidores escolherem entre diferentes modelos de negócio, serviços e níveis de especialização.
Proteger a concorrência saudável significa, paradoxalmente, regulamentar com inteligência. Exigir formação e idoneidade a quem atua diretamente com o consumidor não é restringir a liberdade de acesso à profissão; é reforçá-la. É criar condições para que a confiança não dependa do acaso, mas de um sistema que responsabiliza quem representa o setor no terreno.
Portugal tem hoje um mercado imobiliário competitivo.
Falta-lhe alinhar a sua arquitetura legal com a sua verdadeira dimensão económica e social. Regulamentar é garantir que o dinamismo se sustenta no tempo, sempre aliado à transparência e à liberdade responsável.
Naturalmente, é assim que se constrói um setor robusto: com concorrência livre, sim, mas com regras que protejam quem investe, quem trabalha e, sobretudo, quem confia.