Setor imobiliário – das dúvidas à resiliência

Em 2020 questionávamo-nos sobre se precisaríamos de escritórios com as áreas dos atuais, se as casas deveriam ser maiores para comportarem espaços confortáveis para teletrabalho ou se iriamos assistir a um libertar das cidades e a um ocupar de casas no campo. Houve mesmo quem arriscasse dizer que os hotéis seriam transformados noutra tipologia de empreendimentos, em resultado de algum descrédito no futuro do turismo.Tememos o impacto da legislação Covid nos centros comerciais, decorrente da profusão sucessiva de diplomas legais com claras consequências nas remunerações devidas pelos lojistas. Aliás, ainda hoje esperamos pela fiscalização abstrata da constitucionalidade da norma contida no n.º 5 do artigo 168.º – A da Lei n.º 2/2020, de 31 de março, que aprovou o Orçamento do Estado para 2020, pedida pela Provedora de Justiça, por entender que a referida norma contém restrições inconstitucionais do direito à propriedade privada e da liberdade de iniciativa económica privada, ao não cumprir as exigências decorrentes dos princípios da proporcionalidade e da igualdade. Receámos o descrédito no Golden Visa, em face das incertezas na manutenção do programa que se adivinhavam e que fevereiro de 2021 veio confirmar, com a publicação do Decreto-lei 14/2021, de 12 de fevereiro, justificado pela necessidade de se corrigirem assimetrias regionais, conferindo-se prioridade aos investimentos imobiliários em territórios mais vulneráveis, preferencialmente, em territórios do interior do país.A exposição do setor imobiliário a investidores que procuram aceder ao regime do residente não habitual – sobretudo dos países do norte da Europa – e as críticas de tais países a este regime, fizeram-nos temer algum travão nestes investimentos. Por fim, a tributação, em sede de IMT, na aquisição de sociedades anónimas com imóveis em carteira e o fantasma do congelamento de rendas em contratos de arrendamento mais antigos, também não ajudaram as previsões para 2021.Mas 2021 chegou e, neste momento, perto do seu fim, podemos olhar para trás e constatar que este foi, e continua a ser, um mercado resiliente e que se procura sempre adaptar e reinventar. Em 2021 o segmento habitacional continuou a ser marcado pela procura feita pelo mercado estrangeiro. É certo que com o fim anunciado do Golden Visa (habitacional) em Lisboa, Porto e Algarve (sobretudo), essa procura talvez tenha sido exponenciada, numa espécie de “last call to buy”, sendo por isso muito provável assistirmos a um abrandamento em 2022. Que impacto terá tal abrandamento? Não sabemos, porque não sabemos se o mercado nacional conseguirá substituir-se a estes compradores. A tal resiliência terá que ser demonstrada novamente.Assistimos ao regresso dos investidores estrangeiros também noutros segmentos – hoje voltámos a ser confrontados, por exemplo, com perguntas sobre que portfólios comerciais estão no mercado – isto mesmo depois do pacote de legislação Covid, com as suas sucessivas moratórias e perdões, ter causado algum descrédito em mercados estrangeiros.A procura de prédios para reabilitação, de hotéis, de terrenos para investimento do setor energético ou em empreendimentos turísticos, tudo isto surgiu em força em 2021 e não se antecipa abrandamento em 2022. O que se espera é que a legislação – sobretudo a fiscal, mas também em matéria de arrendamento – não continue a senda de alteração sucessiva e, por isso, instável. Ademais, precisamos, sobretudo, de mais desburocratização (a ideia das escrituras em videoconferência não parece ter afinal saído da gaveta) e de um setor público mas rápido e eficiente no licenciamento dos projetos que se antecipam (e dos já no pipeline). Se assim for, os investidores e os promotores cumprirão a sua parte.

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