Os Quadros Superiores de Empresa no Regime do Residente Não-Habitual

Opinião Bernardo Marques, RSA Advogados Nomeadamente, pelo Decreto-Lei n.º 249/2009 de 23 de setembro (posteriormente revogado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, que aprovou o novo Código Fiscal do Investimento), posteriormente completado pela Portaria n.º 12/2010, de 7 de janeiro, tendo em vista a captação para Portugal de profissionais não residentes qualificados em atividades de elevado valor acrescentado ou da propriedade intelectual, industrial ou know-how, e pensionistas estrangeiros. Do leque dos benefícios fiscais atribuídos aos Residentes Não-habituais abordaremos um tema que tem suscitado algumas dúvidas, o conceito de “Quadros superiores de empresa”, estabelecido da Portaria 12/2010, de 7 de Janeiro, para efeitos de tributação à taxa especial de 20%, estabelecida no n.º 6 do artigo 72.º do Código do IRS. Nos termos da circular n.º 2/2010, da Direção de Serviços do IRS, são Quadros superiores de empresa “(...) as pessoas com cargo de direção e poderes de vinculação da pessoa coletiva”, apontando claramente para a necessidade de preenchimento de um duplo requisito para que determinada função possa ser enquadrada dentro deste regime, (i) o exercício de cargo de direção, e (ii) os poderes de vinculação da sociedade. No que se refere ao exercício de cargos de direção, cremos ser pacífico que o serão os quadros de topo da empresa (e.g. diretor financeiro, diretor de marketing, diretor geral, etc.), que, nos termos do artigo 97.º do Código do trabalho estabelecem “os termos em que o trabalho deve ser prestado, dentro dos limites decorrentes do contrato e das normas que o regem”. Quanto aos poderes de vinculação, a Autoridade Tributária tem entendido que serão todos os poderes conferidos por contrato social, deliberação dos sócios ou de mandato emanado pelos gerentes/administradores, e que resultem na prática de negócios jurídicos que vinculem a entidade perante terceiros. Importa realçar que também por força do contrato de trabalho, a sociedade faz-se representar (e vincula-se) perante terceiros, quando a natureza da atividade exercida pelos seus trabalhadores exija a celebração de negócios jurídicos em nome da sociedade, conforme resulta do artigo 115.º, n.º 3, do Código do Trabalho - o que suscita questões sobre a legalidade da exigência de Procuração normalmente solicitada pela Autoridade Tributária. Sem desmerecer o conteúdo da Circular n.º 2/2010, da Direção de Serviços do IRS, não podemos deixar de levantar algumas reservas quanto à interpretação daí emanada - refira-se que, enquanto instrução administrativa, a referida Circular valerá pelo seu conteúdo doutrinário, não sendo vinculativa para Particulares nem para os tribunais. Ainda que concordemos com a Circular quanto à necessidade de limitação dos “quadros superiores de empresa” aos cidadãos que exerçam funções nos cargos diretivos (ou de topo) das empresas, discordamos, porém, do critério de de vinculação da empresa, nomeadamente que a vinculação terá de ser externa, isto é, perante terceiros. Cremos que esta interpretação restritiva que tem sido aplicada pela Autoridade Tributária quanto ao conceito de “quadro superior de empresa” é contrária ao espírito normativo subjacente à criação do Regime do Residente Não-Habitual, afastando cidadãos profissionais não residentes qualificados, que pela sua atividade promovam domínios estratégicos. Com efeito, nem todos os membros do quadro diretivo que integram a estrutura organizacional de empresa têm poderes de vinculação perante terceiros. Não obstante, questionamos até que ponto o exercício de cargo diretivo não será suficiente per si, para conferir poderes de vinculação da sociedade, nos termos do artigo 115.º, do Código de Trabalho - sempre dentro dos limites impostos pela função exercida. Por outro lado, pode dar-se o caso de existirem cargos de topo que não tenham na sua génese a necessidade de prática de atos de vinculação da empresa perante terceiros, e que não deixam de se poder considerar atividades promovem domínios estratégicos e de interesse relevante para as referidas sociedades. Assim, e sem prejuízo da interpretação constante da Circular n.º 2/2010 e pela aplicação prática que a Autoridade Tributária tem feito deste regime, cremos que se devam considerar como “Quadros superiores de empresas”, para efeitos da Portaria n.º 12/2010, de 7 de Janeiro, todos os cidadãos que exerçam cargos de direção (ou de topo), independentemente dos poderes de vinculação externa da Sociedade. Terminamos com a seguinte questão, para reflexão: será justo que dois cidadãos que ocupem cargos de topo na mesma estrutura organizacional (e.g. diretor financeiro e diretor geral) sejam tratados de maneira diferente pelo ordenamento tributário, pelo simples facto de um deles, no âmbito do exercício das suas funções, ter poderes de vinculação externa da Sociedade?

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