Muita parra e pouca obra nova. Simplifique, Sra. Ministra!

O Governo apresentou, no passado dia 16 de fevereiro, um pacote de medidas para dar resposta aos problemas da Habitação em Portugal. Baseado em cinco eixos fundamentais, este documento é, acima de tudo, muito profícuo em palavras e, infelizmente, pouco capaz de fomentar a construção nova tão necessária. Em jeito de apontamento prévio: medidas mais simples têm maior probabilidade de obter resultados mais eficazes. A maioria do proposto neste pacote é de uma complexidade tal na hora de operacionalizar que pode condicionar, e muito, a sua aplicabilidade. Se pela positiva destaco algumas medidas interessantes, nomeadamente o apoio extraordinário ao pagamento das rendas e a preocupação em simplificar os processos de licenciamento, por outro lado não posso deixar de ficar inquieto devido ao impacto negativo que a eventual aprovação destas medidas, tal como foram apresentadas, poderá representar para o setor. E deixo esta ressalva porque, estando ainda em fase de consulta pública, muita água poderá rolar debaixo desta ponte.Em traços gerais, a mensagem que o Governo passa é contraproducente desde logo porque gera insegurança nos investidores e no investimento privado. E sem estes é complicado, para não dizer impossível, impulsionar a oferta.O maior problema da Habitação em Portugal há muito que está identificado e prendese com o desequilíbrio grande existente entre procura e oferta. Temos falta de casas disponíveis, ou em condições de habitabilidade, para tanta procura e esta realidade não se consegue alterar com medidas impositivas. Este caminho pode até resolver problemas a curto prazo, mas a longo prazo acaba por funcionar como um entrave à colocação significativa de imóveis no mercado.A prioridade neste ponto tem de passar por garantir condições diferentes a promotores e investidores imobiliários. E como? a) facilitar / agilizar os processos; b) dar segurança, criando alguma estabilidade ao nível do enquadramento legal; c) e assegurar retorno. Estas são as três premissas que devem nortear as políticas a definir para o setor.Em termos práticos, isto deve refletir-se em medidas como a criação de vantagens no acesso ao crédito; a redução de prazos nos processos de licenciamento e consequente fiscalização mais eficaz para garantir o cumprimento; redução de impostos associados à construção nova, como por exemplo o IVA nas obras.Além disto, é também fundamental apoiar e incentivar os jovens na aquisição da primeira casa. E também neste aspeto é preferível delinear ações mais simples e exequíveis do que mais complexas e utópicas. Refiro-me a apoios fiscais efetivos como por exemplo a isenção de IMT para os jovens até determinada idade e com um rendimento líquido mensal que não lhes permita fazer face às despesas decorrentes dessa aquisição; criação de apoio ao crédito à habitação em linha com o que existiu há alguns anos, entre outras.Para os investidores que pretendam construir ou reabilitar, com vista ao arrendamento, devem ser criadas condições favoráveis, algumas já referidas acima, acompanhadas pela obrigatoriedade de os imóveis serem depois colocados no mercado com um valor máximo de arrendamento definido à partida. E claro que todas os termos / obrigações devem ser comunicados desde logo aos investidores (ex: definido um preço por m2 por região) para assegurar não só maior transparência como também um clima de maior estabilidade e segurança.Ainda neste campo, não posso deixar de referir que urge olhar rapidamente para o património imobiliário público existente, que deve ser reabilitado e secundado por uma política realmente eficaz para fazer chegar estes imóveis a quem efetivamente mais necessita.Em matéria dos vistos Gold, a decisão de colocar um ponto final não faz sentido e, sobretudo, certamente não resolve o maior dos problemas. É importante termos a consciência que a concessão destes vistos veio não só ajudar a projetar o país no exterior como também contribuiu para criar um tipo de oferta que não existia em Portugal até então e que em nada afeta as faixas da população mais prejudicadas pelas dificuldades no acesso à habitação. Relembro que, segundo dados do SEF, só o ano passado o investimento no país fruto dos vistos Gold ascendeu aos 654 milhões de euros.Outra medida pouco feliz passa pela imposição dos bancos disponibilizarem taxas fixas para os créditos à habitação. Ora, todos sabemos que as taxas fixas são naturalmente mais elevadas do que as taxas variáveis. Por esta razão, numa altura em que parte dos clientes já se vêm confrontados com dificuldades para contraírem crédito, esta medida não servirá de muito. É caso para dizer que vem tarde e a más horas. Teria feito sentido, sim, elucidar as pessoas sobre a inevitabilidade de subida das taxas de juro, que estavam a negativo num contexto excecional, servindo a taxa fixa como garante da estabilidade futura.Mesmo correndo algum risco, por se tratar de um documento ainda de carater provisório, considero que há aqui um evidente desperdício de recursos. É nesse sentido que é um pacote de medidas que se caracteriza por muita parra (conversa) e pouca obra nova, que tanta falta faz para equilibrar o mercado e tornar os preços mais acessíveis.

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