Perspetivas

Mercado voluntário de carbono: o potencial versus a realidade

O mercado voluntário de carbono, recentemente regulamentado em Portugal com a publicação do Decreto-Lei nº 4/2024, tem criado uma grande expectativa entre os intervenientes do setor agroflorestal.

Este mercado, que visa valorizar parte dos serviços de ecossistemas gerados pelos projetos agroflorestais, como o sequestro e armazenamento de carbono, permite que governos, empresas ou indivíduos comprem ou vendam “créditos de carbono” por escolha própria. No entanto, ainda não foram estabelecidos alguns aspetos fundamentais para o reconhecimento do seu potencial e funcionamento eficaz.

Um dos principais desafios que o mercado enfrenta é a falta de conhecimento detalhado sobre os requisitos das metodologias de quantificação de emissões ou remoções de carbono. As metodologias aprovadas pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA), em articulação com o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), são fundamentais para garantir a precisão na contabilização dos créditos de carbono.

No entanto, a ausência de esclarecimentos técnicos detalhados cria um ambiente de incerteza para os promotores de projetos, que podem não estar completamente cientes das exigências ou dos procedimentos necessários para se qualificarem para o mercado.

Outra questão crucial é o princípio da adicionalidade, um dos pilares dos mercados de carbono, que se refere à necessidade de garantir que a implementação do projeto resulta num aumento de sequestro e armazenamento de carbono quando comparado com um cenário base. Em Portugal, este princípio levanta questões complexas, particularmente no que se refere à definição do cenário base.

Se o cenário base considerar a realidade atual das propriedades, pode penalizar produtores que já implementaram práticas de gestão que resultam em altos níveis de sequestro de carbono.

Por outro lado, se o cenário base retroceder a um momento anterior à implementação dessas práticas, poderá criar uma distorção nos incentivos oferecidos pelo mercado. A clara definição do cenário base é essencial para determinar a rentabilidade dos ativos, nesta perspetiva, e a viabilidade dos projetos de sequestro de carbono.

Todas estas questões tornam-se particularmente problemáticas na hora de atrair investimentos. Os investidores procuram segurança e previsibilidade, e a falta de uma definição clara sobre vários aspetos deste mercado pode afastar potenciais interessados.

O futuro depende de ações concretas e da colaboração entre todos os envolvidos. Para que se possa atingir a escala ambicionada, é imperativo que todos os elementos e diretrizes sejam claramente estabelecidos pois, só assim, os investidores poderão começar a explorá-lo com confiança e sustentabilidade, baseando-se em informações precisas e fiáveis.

Apesar dos desafios, o mercado voluntário de carbono em Portugal representa uma oportunidade real para o setor agroflorestal e não deve ser negligenciado. Este mercado é apelativo para quem quer promover a revitalização de terrenos com baixos níveis de gestão ou abandonados, incentivando práticas de gestão que aumentem o sequestro de carbono e, consequentemente, a rentabilidade dessas propriedades.

Se bem estruturado e regulamentado, o mercado voluntário de carbono pode fornecer um novo fluxo de receitas para os produtores, contribuindo, ao mesmo tempo, para a mitigação das alterações climáticas.