Cidades, edifícios e habitações num contexto de pandemia

Opinião A pandemia do Novo Coronavírus Covid-19 veio lembrar velhos propósitos e colocar novos desafios que merecem reflexão, sendo não só aplicáveis a novos empreendimentos, mas também no âmbito da reabilitação urbana e dos edifícios. Nas cidades, destacou-se a necessidade de compatibilizar o afastamento físico com a partilha do espaço público (para circular e aceder a bens e serviços) e de otimizar o uso dos recursos com a preservação da saúde pública. Nos edifícios e nas habitações, destacou-se a necessidade de compatibilizar a integração de vários usos e apropriações (atividades e ritmos dos vários membros das famílias) em espaços tradicionalmente vocacionados para uma vida familiar mais restrita, e de promover fatores de qualidade habitacional até agora menos considerados. Para responder a estes desafios podemos fazer uso do que já se conhece sobre qualidade habitacional e residencial e a sua relação com a saúde. Estes conhecimentos foram consolidados em numerosos estudos realizados ao longo das últimas décadas, nomeadamente pela OMS. No entanto, nem sempre as suas recomendações se tornaram práticas generalizadas. No contexto atual, os seguintes fatores de qualidade habitacional e residencial já identificados no passado ganham especial importância: – Vizinhanças residenciais com equipamentos e serviços de proximidade; – Gestão de espaços comuns e partilhados no edificado e na vizinhança; – Condições de conforto ambiental (e.g., acústico, térmico, visual, qualidade do ar) e seus aspetos subjetivos; – Dimensionamento e organização funcional das habitações que proporcione condições de isolamento e privacidade dos moradores; – Articulação das habitações com os espaços exteriores de uso privado e semiprivado (e.g., varandas, pátios, logradouros); – Flexibilidade e adaptabilidade no uso nas habitações. Ganham também importância, os conhecimentos adquiridos nos estudos recentes sobre território e risco, nomeadamente as recomendações sobre o planeamento urbano que assegure a resiliência adaptativa a contextos de incerteza e a perceção e comunicação do risco. Relativamente a outros fatores, permanece a necessidade de aprofundar os conhecimentos e eventualmente encontrar novos equilíbrios (trades off) para responder a paradoxos que decorrem desta recente experiência e aprendizagem. Por exemplo: – Densificação urbana (com elevada eficiência no uso dos recursos e infraestruturas) versus baixa densidade (com utilização menos intensa dos espaços públicos e comuns mas com maiores custos de infraestruturas e mobilidade); – Controlo do uso e apropriação dos espaços públicos versus novas formas de regulação e códigos de conduta sócio espacial; – Projetar para a “normalidade” versus gestão flexível de ambientes construídos em contextos de emergência; – Separação de funções e espaços quotidianos (métro, boulot, dodo) versus integração de diversas funções no espaço doméstico (i.e., vida familiar, teletrabalho, telescola); – Promoção de formas tradicionais de habitação versus novas formas de habitar para acolher funções regulares e excecionais. Neste sentido, o momento em que nos encontramos inspira-nos na busca e desenvolvimento de soluções que no médio prazo permitam compatibilizar, no ambiente construído, a preservação da saúde pública, o funcionamento da economia e a garantia das liberdade e garantias dos cidadãos. Para o efeito, o LNEC enquanto Instituto Público com atribuições nos domínios da construção e obras públicas, da habitação e urbanismo, do ambiente, e da gestão dos riscos, está empenhado no aprofundamento dos conhecimentos com vista a desenvolver respostas adequadas e bem fundamentadas.

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