A extinção da obrigação de pagamento de rendas mínimas pelos lojistas de centros comerciais até 31 de dezembro de 2020

Esta extinção da obrigação de pagamento das rendas mínimas não é, todavia, extensível à componente variável da renda, calculada sobre as vendas realizadas pelo lojista, nem tão pouco à obrigação de pagamento de todas as despesas contratualmente acordadas, designadamente as referentes a encargos comuns. Enquadramento Importa salientar que apesar de esta medida ter sido aprovada no âmbito do Orçamento Suplementar para 2020, a sua redação teve origem no Projeto de Lei n.º 452/XIV/1.ª, da iniciativa do Partido Comunista Português e também no Projeto de Lei n.º 469/XIV/1.ª, do Bloco de Esquerda. Sucede que ambos os projetos de lei foram rejeitados na votação na generalidade e, até ao momento, não existe nenhum outro diploma que venha regular ou densificar a medida constante do artigo 168.º-A, n.º 5, do Orçamento Suplementar para 2020. Assim, esta medida foi aprovada de forma “isolada” no contexto de um instrumento de gestão que visa conter uma previsão discriminada das receitas e despesas do Estado (sendo que, neste caso, não vislumbramos o impacto que esta medida tem no Orçamento do Estado para 2020). Interpretação do artigo 168.º-A, n.º 5 A redação da disposição legal constante do artigo 168.º-A, n.º 5, do Orçamento Suplementar para 2020, gerou dúvidas interpretativas sobre o que se deve entender por «rendas mínimas». No nosso entendimento, e antecipando desde já a nossa conclusão, o sentido precípuo da medida legislativa foi o de extinguir a obrigação de pagamento da renda fixa devida pelos lojistas, pelos motivos expostos infra. Para uma melhor interpretação da referida disposição, será necessário que se tome como ponto de partida a comparação com o regime excecional para as situações de mora no pagamento das rendas, em especial, nos contratos de arrendamento para fins não habitacionais, aprovado pela Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril (conforme alterada pela Lei n.º 17/2020, de 29 de maio e mais recentemente pela Lei n.º 45/2020, de 20 de agosto). Assim, enquanto a obrigação do pagamento das rendas nos contratos de arrendamento fica sujeita a um regime excecional de mora que apenas implica um diferimento do respetivo pagamento, no caso dos contratos de utilização de loja em centros comerciais (e, nessa medida, não qualificáveis como contratos de arrendamento) parece ter sido temporariamente extinta a obrigação de pagamento da parte fixa das rendas (no sentido em que deixam de ser devidos valores de renda mínimos). Este tratamento diferente de contratos que visam a utilização onerosa de bens imóveis para fins não habitacionais aparenta carecer de fundamento razoável e aponta para uma diferenciação dificilmente compreensível (senão mesmo arbitrária) entre as duas situações. E tanto assim é, que o próprio legislador não efetua tal distinção no âmbito dos próprios contratos de arrendamento, consoante os mesmos estabeleçam, ou não, rendas com componentes fixas e variáveis. Quanto aos contratos que preveem exclusivamente uma remuneração fixa, com exclusão de qualquer outra, apesar de se tratar de uma questão controversa considerando a redação demasiado ampla da norma, entendemos que existem razões para que o proprietário do imóvel venha a sustentar a não aplicação do novo regime. Com efeito, se a razão de ser deste último consiste, como acima admitimos, na possibilidade de segregar em termos abstratos uma componente fixa na renda devida, a sua aplicabilidade estende-se apenas aos casos em que essa mesma possibilidade seja efetiva. A este propósito cabe salientar que, até à mais recente alteração ao regime excecional para as situações de mora no pagamento da renda devida nos termos de contratos de arrendamento urbano, o disposto no referido regime aplicava-se, sem exceção e com as necessárias adaptações, «a outras formas contratuais de exploração de imóveis para fins comerciais». Esta disposição, que agora é excecionada quanto aos estabelecimentos inseridos em conjuntos comerciais, mantinha plena razão de ser, pelo menos, quando as «outras formas contratuais» não envolvessem o estabelecimento de uma renda em termos diversos dos que seriam devidos ao abrigo de um contrato típico de arrendamento. Nestas situações, não nos parece que se possa excluir que seja arguida pelos proprietários dos centros comerciais uma interpretação restritiva da norma do artigo 168.º-A, n.º 5, pela qual se defenda a não aplicabilidade da mesma aos contratos de exploração de espaços em centros comerciais que prevejam exclusivamente uma renda fixa. Conclusão Em suma, não nos parece impossível que a norma em causa possa ver reduzido o seu âmbito de aplicação, atendendo à sua finalidade: poder-se-á sustentar que o fim da regulação consiste em excluir a componente fixa da renda devida e não em excluir esta última no seu todo. De qualquer modo, não afastamos a possibilidade de vir a ser discutida a constitucionalidade desta medida legislativa, em face da potencial violação pela mesma da tutela constitucional da propriedade privada, em conexão com os princípios da proporcionalidade e da igualdade, uma vez que a disposição legislativa em apreço estabelece uma discriminação arbitrária entre senhorios de prédios destinados a arrendamentos não habitacionais e proprietários de centros comerciais.

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