O professor catedrático do ISEG falava durante as “Conversas Diárias – Especial Covid-19”, nova rubrica da VI, partilhando que «ainda é muito cedo e o cenário ainda é muito incerto. Há quem tenha visões muito catastrofistas e quem ache que ainda é possível segurar o ano. As opiniões são muito mais díspares, diferenças de opinião que variam mais de 10%». Mas exemplifica que «mesmo que seja um trimestre com tudo parado, com uma quebra de 30%, esse trimestre já vai valer 7,5% nas contas do ano».
O especialista acredita que «vamos ter uma quebra muito significativa que pode ser superior ao pior ano que tivemos na crise anterior, quando tivemos quebras de mais de 4%», e que estas podem variar entre 4% a 12%, na sua opinião.
Mas os fundamentos da crise são diferentes, e por isso a recuperação poderá ser mais rápida, ou pelo menos diferente. Resta saber «se a malha produtiva se mantém intacta ao fim de um trimestre de paragem. Eu duvido, e por isso poderá haver um efeito prolongado além do trimestre».
Imobiliário: “Vamos verdadeiramente voltar ao que eramos?”
É certo que o imobiliário continuará a ser um ativo de refúgio e de investimento seguro depois da crise, como aliás tem sido, nomeadamente num contexto de grande quebra do mercado de capitais. Mas como será esse mercado num cenário de recuperação?
João Duque afirma que é preciso «ver como é que esse mercado imobiliário vai ser ocupado. A rentabilidade pode ser outra. Vamos verdadeiramente voltar ao que eramos?», questiona, admitindo que «muitas coisas vão mudar na nossa perceção da vida, nomeadamente nas prioridades e onde está verdadeiramente o valor».
Acredita que o teletrabalho vai deixar a sua marca: «vamos passar a fazer isto muito mais vezes depois de nos habituarmos neste tempo. A recuperação da economia pode não ser como estamos a imaginar. As pessoas podem ter aprendido a trabalhar em casa, a usar menos transportes, por exemplo. Mas não fazemos ideia de como isto vai acabar».
“O mais importante agora é garantir a liquidez”
João Duque considera que «o mais importante de tudo agora é garantir que há liquidez», para garantir que «quando vier o “dia da liberdade” os trabalhadores e as empresas ainda existam». Acredita que «o primeiro mês é o mais difícil, porque o processo ainda não está montado».
É o Estado que deverá injetar essa liquidez, «e vai ter de se endividar para isso. Neste momento, o que o Banco Central Europeu fez foi garantir a compra de muitos milhares de milhões, cerca de 18.000 milhões para Portugal, é o dobro do que o ministro das Finanças anunciou como necessidades imediatas para a economia portuguesa neste momento. O BCE tem de garantir que os estados membros colocam dinheiro onde é preciso, emitindo dívida, e havendo um banco que a compra na quase totalidade», explica o economista.
Assegurar os canais de distribuição
João Duque considera que atualmente é fundamental «manter a produção e ter os canais de distribuição a funcionar como deve ser. Temos também de garantir a importação e exportação do que é necessário. Se mantivermos a distribuição a funcionar bem, isto permite que “não falte o pão”. Há canais que têm de ser absolutamente garantidos 24h por dia».
«Temos de perceber o que é que as pessoas precisam de forma diária. Seja papel higiénico, álcool, pão. Temos de perceber também o que é que não precisamos, como roupa. Perceber o que é verdadeiramente essencial com escolha», considera.
Se as duas variáveis funcionarem, «garantimos que as pessoas têm dinheiro para viver e para fazer as suas compras, e podemos aguentar até acabar o problema». E, posteriormente, «vamos tratar de outros doentes, nomeadamente de algumas empresas».