Ou, pelo menos, é este o sentimento dominante entre os participantes do seminário «Mercado de investimento - na senda da nova normalidade», organizado pela Savills Portugal na tarde de 11 de maio, e que reuniu online Ismael Clemente, CEO da Merlin Properties, Alejandro Moya, partner da Incus Capital, Miguel Santana, Board Member na Fidelidade Property e Victor Freitas Duarte, Director de New Investment Vehicles na Sonae Sierra.
Embora com perspetivas divergentes quanto à forma como poderá ser a recuperação da atual crise, todos estes investidores concordam que no pós-covid as suas estratégias irão convergir rumo a ativos core. «Temos uma estratégia muito flexível, pois olhamos para cada investidor e para cada oportunidade de forma individualizada, e é isso que continuaremos a fazer. Mas, sem dúvida que neste momento preferimos focar-nos em ativos de melhor qualidade, mesmo que com alavancagem mais alta, pois também serão estes os primeiros a dominar e a recuperar na retoma da economia», afirmou Alejandro Moya.
Da mesma forma, não anteveem para já grandes alterações no que diz respeito à sua estratégia de investimento no médio prazo, lembrando que embora sejam esperadas menos transações nos próximos meses, isso deve-se sobretudo a um compasso de espera para tentar perceber como irá evoluir esta crise e a sua saída; pois «continua a haver muita liquidez no mercado» e «o imobiliário está longe de ser dos piores tipos de ativos para refúgio dos investidores», como disse em tom humorado, o CEO da Merlin Properties.
Escritórios e logística concentram os planos da Merlin
Falando um pouco dos planos da maior socimi espanhola, Ismael Clemente explica que no caso dos escritórios «grande parte do nosso investimento vai continuar a ser direcionado para o nosso programa de revalorização de ativos, de modo a potencializar daqueles edifícios que temos em localizações prime acrescentando-lhes valor correspondente à sua localização geográfica». A logística é outra das grandes apostas da Merlin, que nesta fase está a investir «essencialmente em projetos green-field built-to core», ou seja, «na altura certa, tivemos oportunidade de adquirir terrenos muito bem localizados a preços competitivos, algo que agora já não seria possível; e vamos agora investir aí em promoção». Um posicionamento que se prende essencialmente pela enorme escassez de oferta moderna e de qualidade disponível, provocando um enorme gap com a procura existente por este tipo de produto. «Atualmente cerca de 12% da nossa receita advém da logística, mas o objetivo é elevar o seu peso para 20% quando tivermos em operação os projetos que já estamos a desenvolver», avançou Clemente. A futura plataforma logística de Lisboa Norte, à entrada da capital portuguesa, é um dos maiores investimentos que a Merlin já tem confirmados neste campo.
«Onde provavelmente vamos pisar um bocadinho o travão é no retalho», admite o CEO da Merlin, explicando que neste setor o investimento destina-se agora essencialmente a modernizar os seus centros comerciais dominantes e a adaptá-los à transição omnicanal. Até porque, tanto em Espanha como em Portugal «não vai ser possível fazer projetos greenfield durante muito tempo, pelo menos até o mercado acabar de fazer uma nova limpeza entre aqueles que serão os centros perdedores e os vencedores», considera.
Ainda que a habitação seja uma classe em ascensão junto dos investidores imobiliários de toda a Europa, como mostrou no início da sessão a diretora de research da Savills Portugal, Alexandra Gomes; esta continua a estar de fora dos planos da Merlin. «O mercado residencial tem um enorme potencial de investimento, mas infelizmente em Espanha o mercado habitacional, e em especial o arrendamento, continua a ser pouco racional e, ao invés, muito emocional; e isso não é interessante para nós».
«Somos investidores core por definição. E, por isso, a fazer alguma aquisição será sempre um ativo de rendimento core», remata Ismael Clemente.
Acrescentar valor aos ativos em carteira é prioridade
Valorizar os ativos em carteira é também a grande prioridade estratégica na Sonae Sierra, como admitiu Victor Freitas Duarte. «Vamos manter a nossa estratégia, que assenta sobretudo na necessidade valorizar os ativos que temos em carteira», explica o Director de New Investment Vehicles. A construção de uma terceira torre de escritórios no centro Colombo, em Lisboa, a expansão do Norte Shopping, em Matosinhos, ou a criação de um outlet ancorado ao centro comercial Plaza Mayor, em Espanha, são alguns dos novos projetos em carteira. «Acreditamos em centros comerciais dominantes, e desta forma queremos que fiquem ainda mais dominantes», diz.
No fundo, «privilegiamos o core e assim vamos continuar. E, é com isso em vista que vamos continuar a reposicionar o nosso portfólio», afirma o responsável da Sonae Sierra, logo acrescentando que «investir em ativos e segmentos core é algo que faz sempre sentido em qualquer momento do ciclo. Mas, os ciclos mudam e as suas dinâmicas também, pelo que é possível que nesta fase surjam algumas oportunidades em condições mais atrativas que até aqui há alguns meses não existiam devido sobretudo à forte concorrência a nível de preços». Para Victor Freitas Duarte, «neste momento, o long-income é um tipo de investimento a privilegiar».
«Vamos prosseguir o objetivo de criar um novo CBD em Lisboa»
Os escritórios são também a prioridade da Fidelidade Property. «Basicamente a nossa política de investimento é para manter», afirmou Miguel Santana, acrescentando que «vamos prosseguir com o projeto de Entrecampos e com o nosso objetivo de criar um novo CBD em Lisboa». Tendo investido 274 milhões na compra daqueles terrenos, a Fidelidade vai ali liderar a maior operação de urbanização desenvolvida na capital portuguesa desde a Expo98, prevendo a construção de vários edifícios de escritórios, mas também de habitação e comércio. «Vamos conseguir ajustar o nosso projeto ao que o mercado vai ditar», afirma o administrador empresa, mostrando-se confiante que «a necessidade escritórios nunca vai desaparecer. O Covid-19 veio acelerar uma série de tendências entre as quais o regime do teletrabalho que, sem dúvida, ganhará mais peso no futuro; mas veio também trazer novos requisitos e exigências relacionados com a segurança sanitária, além das questões ambientais, pelo que se por um lado é verdade que haverão menos pessoas reunidas de cada vez nos escritórios, por outro lado também se vão aumentar as exigências de qualidade do espaço bem como o rácio de área por colaborador», antevê. Maiores desafios são esperados para o retalho que, considera, «terá de se reinventar», pois «a pandemia veio ditar o acelerar do consumo online, e isso já não vai parar».
A prazo os planos da Fidelidade poderão passar também pela logística, admite o administrador, contando que «detemos alguns ativos localizados nos arredores de Lisboa que gostaríamos de reposicionar, adaptando-os à procura latente».